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quarta-feira, março 12, 2008

PONTO CRÍTICO: Carta ao Ministro da Cultura





SENHOR MINISTRO: COITADO DO TEATRO NACIONAL!



1. Agora que a nova equipa dirigente do Ministério da Cultura se encontra a estudar os dossiers herdados da catastrófica gestão anterior, é chegada a altura de, uma vez mais, a opinião pública que-ainda-tem opinião (antigamente, a palavra “opinião” significava, correntemente, “orgulho”, “vaidade”, “cuidado com a imagem”) voltar a pronunciar-se sobre um desses tópicos crónicos na cultura portuguesa: a questão dos teatros públicos.
Pelo lado da música, Augusto Seabra, no seu blog, e Ruy Vieira Nery, em suportes e circunstâncias variados, constituem algumas das raras vozes que perseguem uma incansável missão de debate e de contundente esclarecimento. Pela dança, temos ouvido, constantemente, o crítico Tiago Bartolomeu Costa a fazer o ponto da situação institucional.
O teatro, porém, vítima da sua própria transversalidade e advogado “hibridismo”, perdeu lugar e vozes de legitimação e raros são ainda os críticos, os jornalistas ou os ensaístas que enfrentam a incómoda (e pouco remuneradora) tarefa de investigar, informar e divulgar as mazelas que tingem o tecido teatral português contemporâneo.
Uma pequena excepção aconteceu, porém, no sábado 1 de Março p.p. no semanário Expresso de boa memória.
Com algum destaque, o Primeiro Caderno ostentou nas suas colunas um pequeno e circunspecto artigo, assinado pelos jornalistas Cristina Margato e Hugo Franco, intitulado “Directores do D. Maria em Rota de Colisão” (p. 25), onde se levanta a questão de ter o “recente aluguer do Teatro Villaret por parte do D. Maria [agudizado] o mal-estar entre os membros do conselho de administração do teatro nacional”. Interrogadas, desassombradamente, fontes muito próximas do Teatro Nacional que reivindicaram o anonimato, principalmente sobre o que teria ficado por dizer naquela notícia, as respostas foram todas na mesma direcção:
A matéria em si – ou seja, o aluguer do Teatro Villaret ao empresário Vasco Morgado, Júnior pela módica quantia de 11.000 euros mensais e o assumir de obras de adequação a normas (mínimas) de segurança (cerca de 329.0000 euros) – não será, então, senão uma ponta de
um gigantesco iceberg a que se pode chamar “a dívida do Teatro Nacional” (que algumas dessas fontes calculam em cerca de um milhão e meio de euros). Fácil me foi concluir que, afinal, o que os jornalistas não disseram claramente é que os motivos para a referida “rota de colisão” em que os dois membros do Conselho de Administração [Carlos Fragateiro e José Manuel Castanheira]
entraram em Fevereiro de 2007 não se esgota no aluguer de um edifício patrimonial mas privado – o Teatro Villaret – mas que essa colisão se estende (e estará documentada em actas e relatórios) a toda uma gestão, artística e administrativa, que, com o conhecimento prévio da Ministra Pires de Lima e do seu Secretário de Estado, vem afundando o Teatro Nacional D. Maria II na mais profunda depressão e na mais inexplicável mediocridade e mau nome nacional e internacional.
2. Não é segredo para ninguém, realmente, que os Teatros Nacionais têm vogado nas ondas erráticas de um Estado que, historicamente, nunca teve jeito para gestão cultural, mas também não é segredo para ninguém que a actual gestão do Teatro Nacional D. Maria II vem sendo protegida, amparada e encoberta nas suas vicissitudes (dívidas a credores azedos, como foi o caso do Teatro Mundial/Almeno Gonçalves que envolveu tribunal e acordos, falta de pagamento a tempo e horas aos funcionários, falta de pagamento a artistas exteriores, incumprimento de compromissos de programação nacional – vejam-se as programações anunciadas e as realizadas - mas também internacional, etc., etc., etc.) pelo actual Governo e pela autarquia lisboeta.
O grande aparato com que Isabel Pires de Lima e Mário Carvalho apresentaram, em Janeiro de 2006, a “nova linha estratégica” para o TN e a subsequente defesa da vocação deste para o “grande público” em oposição ao que o Ministério chamou então “público restrito” (faltando, no entanto, fundamentar se para atingir o“grande público”, cuja dimensão nunca foi definida, se deveria levar o Teatro Nacional D. Maria II a ser uma duplicata com mais dinheiro do Teatro da Trindade vocacionado para o entretenimento, o amadorismo e as produções artisticamente menos relevantes como é o caso, tremendo, do Memorial do Convento, mais uma das reprises no Nacional da programação do INATEL) deixavam prever a catástrofe que veio a acontecer.
3. Seja qual for a dimensão exacta da dívida do Teatro Nacional, sejam quantas forem as cenas com os credores, sejam quais forem as falhas de compromissos assumidos, uma coisa me parece certa (e concordo com o que publicamente afirmou Clara Ferreira Alves sobre a matéria), e a José António Pinto-Ribeiro só restam duas alternativas: ou faz como Pires de Lima que, por sobrevivência política, não lia – ou não reagia - aos Relatórios e outras informações que lhe chegariam ao gabinete ou, ousando enfrentar algum PS (Jorge Coelho?) e alguma Maçonaria, tem de pedir contas à administração do Nacional. O crescente derramamento do orçamento no aluguer de espaços (Teatro Villaret, Teatro da Politécnica, Pinhal Novo, Cartaxo, Amadora, Estação do Rossio/REFER, etc.) para apresentação de espectáculos sem critério artístico consistente, o recurso a endividamento com empréstimos, a terceiromundista protecção a projectos estrangeiros sem equidade de contrapartidas (França, Brasil), a manutenção de um teatro sem acolhimento condigno (restaurante, café, etc.) ou o abastardamento da sua fachada com vedetas de futebol, são alguns dos aspectos a solicitar as urgentes medidas que se esperam de um Ministro da Cultura com mundo e discurso cultural.
4. E já se fazem apostas no campo: será que o Ministro chamará Ricardo Pais, funcionário do Ministério da Cultura e precioso director do Teatro Nacional S. João, para retomar, com novos contornos, o projecto antigo de um Super-Director dos Teatros Nacionais? Para o assessorar prevejo dois Carlos: o actor-encenador Carlos Pimenta ou o autor-encenador Carlos Pessoa.
Veremos quem ganha mais esta aposta entusiasmante.




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