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sexta-feira, março 28, 2008

LUCIANNO MAZZA... NA SENDA DO ÊXITO




Este blog também se interessa pelo que de bom se faz no Brasil irmão. E é com prazer que aqui noticiamos o sucesso do nosso amigo LUCIANNO MAZA


A MEMÓRIA DOS MENINOS

texto e direção de Lucianno Maza

com Clóvis Tôrres e Fabiano Medeiros

Teatrix (Rua Peixoto Gomide 2066 - Jd.Paulista)

"O espetáculo que marca a estréia paulista do autor e diretor carioca encontra um equilíbrio interessante ao contrapor a linguagem que flerta com o melodrama com uma encenação fria." Gabriela Mellão para Bravo! (seleção Bravo! de melhores espetáculos - ed.Fevereiro)

"(...) atuações que estão simplesmente maravilhosas. (...) sentimentos que contagiam o público. Tanto por causa da dramaturgia, quanto pelos intérpretes (...) A montagem merece ser vista por todas as qualidades."Maria Lucia Candeias especial para Aplauso Brasil

A HISTÓRIA DELA
um poema cênico sobre o amor e a implacável passagem do tempo
texto de Gabriela Mellão
direção de Lucianno Maza
"Dotada de lógica própria, "A História Dela" tem um tempo diferente do cronológico. É ao mesmo tempo contada e vivida ao longo de um jantar em que o casal comemora 20 anos de casamento, interceptado por pedaços de vida imaginados, desejados, experimentados ou prestes a serem vivenciados, os quais influenciam os personagens mudando os rumos da comemoração."
"A História Dela" e de todos nós. Uma peça de musicalidade erudita, construída sobre uma plataforma suspensa às alturas da lembrança confusa e da loucura do amor, a metros de distância do asfalto da realidade. Foi um desafio transformar em matéria cênica, em imagem e sentido, o que é tão forte e belo em sua abstração lírica."
com Clóvis Tôrres & Luah Galvão


LUCIANNO MAZA: UM CASO DE PAIXÃO ESSENCIAL PELO TEATRO!
entrevista com Lucianno Maza
Por Clóvis Tôrres
Lucianno Maza é um jovem carioca que acaba de mudar para São Paulo, um dramaturgo que não gosta de comentar a idade. Às perguntas sobre sua idade, responde que prefere aguçar a �algo mitológico�, mas não fala quantos anos tem. Diz que nada é essencial para ninguém, que cada um tem suas necessidades, mas admite o que lhe é essência: a paixão. Pudera, com pouca idade (ou seria só aparência?), ele está na estrada e não brinca em serviço; ou melhor, alimenta sua essência infantil brincando de construir personagens para exercitar com seriedade seu teatro. Diz que optou pelo caminho da afetividade e que é preciso ser verdadeiro, sempre, sempre desnudar-se. Criador do DRAMA TEMPO, um projeto de leituras de dramaturgia contemporânea, no Rio de Janeiro, que reuniu mais de 250 artistas e que por hora está �descansando� enquanto o autor/produtor/agitador encontra novos espaços, ele nos concedeu uma bela entrevista. Aqui, ele fala de sua paixão pelo teatro, leis de incentivo, seu teatro cívico e se posiciona. �Espero que Baco não me deixe faltar o vinho da paixão!. Evoé! Boa leitura.
Letras Em Cena: Lucianno, você tem formação de ator e depois se tornou dramaturgo e diretor. Como foi este processo?
Lucianno: Minha formação de ator se deu muito, também, através de estudos em oficinas como as do Centro de Estudos que a Ana Kfouri coordena no SESC Rio, lá tive contato com uma pesquisa mais autoral (no caso focada no corpo), dessa forma fui aprendendo a colaborar ativamente na criação cênica, e tomando gosto por essa construção, até mais do que pela execução dela. Com isso e em contato com alguns colegas que estavam nesta mesma busca, como a atriz Cristina Froment, acabei me encorajando como autor, os textos que sempre escrevi finalmente vieram à tona, e eu quis concretizá-los. Em menos de um ano aconteceu a primeira montagem (�Boi da Cara Preta� numa boate carioca), mas então havia uma carência de diretores jovens, que quisessem montar textos de dramaturgos jovens (não que esta intercomunicabilidade geracional seja indispensável, mas por parte das gerações mais velhas de diretores ainda não havia interesse pelos novos autores, salvo pontuais exceções). Assim, eu, como outros dramaturgos da geração 2000 (se é que já podemos falar com este distanciamento do nosso próprio tempo), dirigi meu texto para que ele pudesse então ser encenado. Mas como sempre tive o olhar pra cena muito curioso e interesse também na materialização do texto, dirigir sempre foi muito prazeroso. A transição de ator para dramaturgo e diretor se deu aos poucos, e eu diria naturalmente. De vez em quando sinto lá no fundo uma vontade de voltar a atuar, de participar da brincadeira antiga e divina que é o ato de representar, de estar na catarse, mas agora tenho me dedicado à escrita teatral e à encenação e minha paixão é construir e mostrar meus personagens sonhados.
Letras: Como se descobriu autor?
Lucianno: A história é aquele velho clichê do garoto diferente dos demais, que tinha como passatempo preferido ler, e foi construindo seu imaginário e dialogando com ele. Com o tempo é natural sair dessa imaginação, mas acho que fiquei lá. Primeiro desenhos, e depois a forma de narrar o que acontecia lá (na imaginação) foi escrevendo... Construindo e reconstruindo minhas histórias. Escrever então sempre me foi muito natural, e até certo momento eu achava um absurdo as pessoas que não faziam isso, era algo tão indispensável, me perguntava como elas conseguiam viver sem escrever e ler muito? Fui crescendo e tudo que aprendi, li e vivi foi indo para minha escrita, me descobri autor conscientemente ao mesmo tempo em que me descobri homem, e percebi que escrevendo, principalmente, que queria falar ao mundo. Como sempre estudei teatro, e desde criança fui fascinado por ele (um obrigado à minha mãe por sempre ter me levado ao teatro quando isso já estava, infelizmente, em desuso e ao Carlos Henrique Casanova, primeiro autor e diretor que conheci), a dramaturgia foi o caminho.
Letras: Você é carioca, idealizou e realizou, no Rio, o projeto DRAMA TEMPO � Ciclo de Leituras Dramaturgia Contemporânea. Como surgiu esta idéia e quais foram os �resultados� deste trabalho?
Lucianno: A idéia do DRAMA TEMPO surgiu a partir da necessidade de expor minha pesquisa dramatúrgica de autores brasileiros contemporâneos, e também documentá-los, contribuir para o registro da História que se faz hoje e que daqui há 10 ou 20 anos será indispensável conhecer. Me concentrei na produção dos anos 90 e 2000 e �descobri� grandes dramaturgos que muita gente não conhecia porque não havia onde se manter contato com eles, com suas obras, ao mesmo tempo que muitos jovens dramaturgos me �descobriram� e mandaram textos. No final de 2004 surgiu a oportunidade num espaço público do Rio para fazer a leitura de uma peça minha, então propus um projeto fixo, de continuidade, que fosse um pólo de pesquisa, mostra e discussão da dramaturgia brasileira. Assim surgiu em Janeiro de 2005 o DRAMA TEMPO � Ciclo de Leituras Dramaturgia Contemporânea. Os resultados desse trabalho foram muito positivos para quem passou por ele, seja participando, seja assistindo, e durante dois anos foi um dos poucos espaços democráticos no Rio para se mostrar e debater os textos de autores contemporâneos (novos ou renomados) e fomentar suas produções. De certa forma o DRAMA TEMPO supriu essa carência e vários jovens dramaturgos que hoje estão em cartaz no Rio começaram ou passaram pelo projeto como Renata Mizrahi, Julia Spadaccini e Rodrigo Nogueira.
Letras: Gostaria que você comentasse, inclusive, as influências que este trabalho (DRAMA TEMPO) exerceu sobre sua própria dramaturgia à medida que você abriu um espaço para discussão sobre dramaturgia contemporânea onde, obviamente, teu trabalho estava em pauta também.
Lucianno: Essa minha pesquisa da dramaturgia contemporânea que deu origem ao DRAMA TEMPO, me apresentou autores novos, e muitos deles me mostraram possibilidades estruturais que me eram desconhecidas, um apuro característico de cada um na carpintaria dramatúrgica e nos diálogos, e fui percebendo e absorvendo tudo isso. Com o projeto, a leitura de peças se intensificou ainda mais, e os debates sempre foram muito enriquecedores, dessa forma vários autores, diretores, atores e mesmo o público que estiveram nas leituras dramatizadas contribuíram para minha atual dramaturgia. E, ao mostrar meu trabalho ali (fiz leituras de algumas peças minhas), experimentei minha dramaturgia muito à vontade, observando o que era bom ou nem tanto. Aprendi e evoluí muito como dramaturgo nos dois anos de trabalho no DRAMA TEMPO, seja com os nomes renomados que passaram por lá, sejam pelos jovens que como eu estão iniciando a construção de suas trajetórias.
Letras: O Drama Tempo reuniu aproximadamente 250 artistas em 60 leituras. Um sucesso, especialmente se levarmos em consideração que era um projeto de leitura. É inevitável a pergunta: Por que acabou? Quais foram as dificuldades para levar o projeto adiante?
Lucianno: Prefiro dizer que o DRAMA TEMPO está em descanso, o projeto não acabou, e espero poder voltar a fazê-lo um dia, e em breve, seja no Rio, em São Paulo, ou em qualquer outro lugar. Foi um privilégio muito grande que tive, e espero poder ter a chance de voltar a dar espaço a gente tão bacana e talentosa como esses quase 250 artistas que você citou. O projeto foi uma empreitada de sucesso sim, e durante um bom tempo foi muito comentado, mas vou ser muito sincero sobre o que levou o projeto a parar no final do ano passado: posso dividir a História do DRAMA TEMPO em quatro fases, além das edições especiais com dramaturgia internacional. Na penúltima dessas quatro fases, contei com a parceria da atriz e produtora Lenita Medina, que foi imprescindível para a afirmação do projeto no teatro carioca. No entanto ela teve que deixar a organização e novamente fiquei sozinho, mas desta vez estava comprometido com outros trabalhos, o que me impossibilitou de dedicar-me tanto quanto seria necessário (na última fase a periodicidade do projeto foi mensal, enquanto nos 18 meses anteriores foi semanal). Além disso, criei o projeto para toda classe teatral e o que esperava era o envolvimento da mesma, a participação, mas isso de fato não estava acontecendo, infelizmente todos queriam e gostavam muito de ler no projeto, de mostrar seus trabalhos, mas poucos eram os que continuamente o acompanhavam e incentivavam. O desinteresse da classe carioca com o projeto que era dela acabou prejudicando-o (na divulgação, nos apoios, no público), e não havia mais condições de continuar sozinho (�uma andorinha só...�) e sem apoio, e como sempre fiz sem incentivos ou subsídios, tinha que despender grande energia, tempo e dinheiro. Ficou inviável e doloroso continuar quixotescamente.
Letras: Em que pé está sua pesquisa cívica-teatral sobre novas possibilidades de encenação e relação entre artistas e o público?
Lucianno: Fazer teatro é sempre um ato cívico (às vezes até militar): o comprometimento, a batalha, a causa. Mas acredito que você se refira à trilogia �Modo de Preparo�, que tenho tanto carinho, e que estou fazendo paralelamente aos meus outros trabalhos. Nesta trilogia o meu foco é na civilidade cênica: no discurso pessoal artístico e na relação entre os artistas e estes com o público. O grande tema é, então, o próprio teatro. No verão do ano passado comecei a experimentar esse caminho com o �quaseTUDO�, um happening com 13 atores e textos de 8 dramaturgos (alguns os próprios atores), ele antecedeu a trilogia e me permitiu colocar em cena algumas reflexões. Em maio de 2007, fiz no Rio duas apresentações da primeira parte do �Modo de Preparo�, o passo 1, convidei a atriz Simone Spoladore e foi uma experiência definitiva. O primeiro momento da pesquisa não tem uma estética predominante ou um único assunto, o que fazemos é expor nosso pensamento como pessoas sobre o teatro e a vida hoje, e tudo que se engloba nisso (classes, política, História pessoal), mostrando também nossa relação pessoal e profissional: a gênese da nossa parceria; a partir dessa difícil auto-exposição inserimos as outras pessoas presentes (que não chamaria de espectadores ou público, mas sim de convidados) no acontecimento, que também se manifestam, expõem seus pensamentos, e podem assumir a posição de criadores propondo ou intervindo no que estiver acontecendo. Não se trata de teatro interativo, mas mais de interação humana. Procuramos ser sinceros em nossas forças e fragilidades como artistas. Queremos o contato, a troca, a delicadeza. A Simone levou um texto que perguntava: �ser artista te torna menos ou mais vulnerável na vida?�. Meu papel foi criar essa concepção, orientar e propor para Simone as reflexões, contribuindo com textos dramáticos que mostrassem meu discurso, além de escrever em cena durante a apresentação um texto único para cada noite, buscando captar o que acontecia ali: comigo, com ela, com nossos convidados. O interessante é notar que quanto mais próximo daquilo que realmente acreditamos, somos e queremos falar, quanto mais expostos, mais bonito era, e mais o público pegava em nossa mão... O primeiro passo dessa pesquisa então quer tirar as máscaras (e como nós artistas gostamos de uma máscara...) que acabam nos tapando e também aos nossos olhos, e ao tirarmos nos mostrarmos: para sermos vistos e também para ver.
Letras: Você agora está em São Paulo, por que mudou de cidade? Dá para fazer um paralelo entre as produções teatrais do Rio e São Paulo? Quais são as diferenças entre estas produções?
Lucianno: Sempre fui atraído por São Paulo, por essa metrópole gigante, por essa mistura de povos, essa diversidade cultural que vai até os pontos mais inusitados ou desconhecidos. Claro que o Rio é minha terra, mas sempre quis morar aqui, ao menos por algum tempo. Depois de dois anos direto de trabalhos no Rio: DRAMA TEMPO, os espetáculos �TRÊS T3MPOS� e �Restos� (que foi montado com co-direção da Tatjana Vereza no Centro de Referência da Dramaturgia Contemporânea), e a viagem com meu repertório para uma mostra no sertão do Ceará, senti que precisava de uma virada, de uma mudança na minha vida. E a situação do mercado teatral carioca está (e continua) muito mal, não dando a menor condição de produção e sobrevivência, é tudo muito complicado: faltam investimentos, faltam políticas estaduais e municipais, falta interesse e o principal (que leva a todo resto): falta engajamento, união de grande parte da classe. Cansado disso tudo, ainda que um pouco triste, resolvi sair da minha cidade, e São Paulo foi o destino: finalmente eu começaria uma nova etapa, na cidade que tanto queria conhecer o mercado e a vida de perto. Sobre o paralelo entre as produções das duas cidades: com a globalização as temáticas são comuns a qualquer lugar do mundo, há assuntos específicos, localizados, mas até estes hoje dizem respeito ao mundo tudo (não cabe mais ao pensamento contemporâneo uma pergunta como �o quê eu tenho a ver com o que está acontecendo no Iraque?�). Assim, entre as temáticas abordadas no teatro carioca e no teatro paulistano, não vejo diferenças. Tampouco em qualidade. O que acontece é que, por exemplo, o movimento da �nova dramaturgia� aqui em São Paulo começou nos anos 90, enquanto no Rio começou mesmo só nos anos 2000, com atraso de uma década. Com isso, enquanto os autores paulistanos da nova geração já tinham experimentado várias possibilidades e amadurecido suas escritas, os cariocas ainda estavam começando, se descobrindo, se identificando. Hoje, acho que a produção dramatúrgica das duas cidades está equivalente nestes termos, com a diferença de que em São Paulo há muito mais condições de se mostrar o trabalho, e é só quando se leva à cena o texto que o dramaturgo tem chances de se auto-analisar e amadurecer.
Letras: O que destacaria em nossa cena teatral que poderia ser a nossa identidade paulistana e a identidade carioca?
Lucianno: Aqui a diversidade, sem dúvida. Há muita coisa acontecendo na cena teatral paulistana, de todos os tipos, com gente de diferentes lugares, formações e interesses. Coisas maravilhosas, outras não. Mas estão acontecendo. E essa multiplicidade é muito boa. Só fazendo muito teatro é que teremos um bom teatro. No Rio também há diversidade, mas a cidade não dá muita oportunidade disso ser mostrado. Uma das características de grande parte dos cariocas é o apreço por modismos, e isso acontece também no teatro, então temos �fases� onde quase todo mundo se aventura na mesma coisa, menos por interesse pessoal, e mais por necessidade de mercado, desejo de aceitação ou interesse financeiro. Além disso, São Paulo me parece receber melhor novos nomes, independente das referências daquele artista, enquanto no Rio ainda acontece muito a valorização pessoal de quem ele é, o que ele fez, quem ele conhece, e não seu trabalho. Mas é importante dizer que sinto o início de uma mudança lá, o que é muito bom!
Letras: Quais são seus autores preferidos?
Lucianno: São tantos... Importantes em vários momentos da minha vida... Em literatura me vêm à cabeça sempre a poesia (mesmo que em prosa) profunda da Hilda Hilst, a construção da imagem e crítica contemporânea do José Saramago, e Jean Paul-Sartre e sua filosofia do homem condenado à liberdade, e ainda Clarice Lispector, Caio Fernando Abreu e Virginia Woolf. Dramaturgos são ainda mais, de brasileiros estamos muito bem, começaria pela maestria de sensibilidade do Alcides Nogueira que une com toda força a poesia e a loucura da vida e do sonho, e cito ainda Dionísio Neto, Bosco Brasil, Afonso Henrique-Soares, Roberto Alvim, Samir Yazbek, Sergio Roveri, são muitos... Dos internacionais que mais gosto destaco Anton Tchecov, Samuel Beckett e Sarah Kane. E há ainda os meus autores de cinema preferidos, principalmente o David Lynch, o Charlie Kaufman e o Woody Allen.
Letras: O que você acha essencial para um dramaturgo?
Lucianno: Acho que não tem nada que seja essencial para ninguém. Cada um tem suas necessidades. Mas posso dizer o que me é essencial: paixão. Paixão pelo Homem, pelo que ele pode fazer, por seus mistérios, por uma história que eu queira contar. A partir disso posso criar... E me é indispensável ainda saber o que está acontecendo hoje, acompanhar a produção artística (ler muito, ouvir muito, assistir muito), estudar tudo que desperta interesse, e sempre me analisar, olhar pra mim mesmo, pro que penso, refletir, me confrontar. E a segurança, que é importante e muito difícil conquistar, meu amigo e geralmente primeiro leitor, o ator e produtor Marcelo Albuquerque, que o diga... Antes eu tinha uma necessidade grande de receber um retorno imediato para satisfazer minha ansiedade e insegurança, hoje isso ainda existe, mas menos, fui ganhando segurança no que faço. Acreditando no meu teatro. E acho importante para qualquer dramaturgo, aliás, para qualquer pessoa, se perguntar sempre �o quê� e �como� se quer dizer, mesmo que a criação seja por um jorro inconsciente (daí se pergunta depois, se afirma o desejo de falar aquilo).
Letras: Você tem acompanhado muitas mudanças nas produções teatrais, tais como a Lei Rouanet, Lei Mendonça, Programa Municipal de Fomento para a cidade de São Paulo e agora o PAC estadual? Qual sua opinião e avaliação sobre estas políticas?
Lucianno: Estou há pouquíssimo tempo morando em São Paulo, mas minha impressão do Fomento, acompanhando de fora, é que o programa tem um ideal muito importante que é esta valorização da pesquisa continuada, do trabalho de grupo, onde, acredito, o teatro mais se alimenta e onde está a base de qualquer mercado teatral. Sobre a Lei Mendonça e o PAC do Estado, ainda não tenho informações o suficiente para avaliá-los. No caso da Lei Rouanet, acho que temos um grande problema. A Lei de Incentivo Fiscal Federal é necessária, mas acredito que está completamente equivocada: ela beneficia muito as empresas que ganham em retorno de marketing patrocinando peças com atores de grande apelo junto ao mercado consumidor; mas o teatro se beneficia muito pouco com a Lei, (salvo louváveis exceções) o que se vê é o investimento das empresas sempre buscando lucro (ainda que indireto através do marketing) em peças que apresentem retorno comercial, não há na maioria dos casos um foco verdadeiramente artístico por parte dos empresários. Acho absurdo que tenhamos que tratar com diretores de marketing nossas artes, e dizer-lhes o quanto ela é rentável mostrando projeções, clippings e gráficos. O antigo mecenato que inspira a Lei Rounet era baseado justamente no contrário: no auxílio ao artista cuja obra não pleiteava retorno comercial diretamente. A liberdade democrática de cada empresa escolher no que investirá é muito boa na teoria, mas na prática a vejo ser deturpada, e o investimento escoar naquilo que lhe trará sempre mais retorno. O dinheiro dos investimentos é imposto, é público, nos pertence e deveria ser democratizado realmente.
Letras: Se fosse convidado a dar uma idéia sobre lei de fomento ou de renúncia fiscal para a produção teatral, o que diria?
Lucianno: A Lei do Fomento eu acho está num bom caminho, mas pelo que acompanhei na última reunião que estive presente aqui em São Paulo, se faz necessário um reajuste de verba e de número de grupos contemplados. E sou a favor da quebra de sigilo sobre a votação, expondo os votos de quem participa do júri selecionador em qualquer programa de incentivo desse tipo. Acho que fica mais transparente e responsável desta forma, por mais que possa causar aos participantes algum constrangimento pessoal. Sobre a Lei Rounet e outras de renúncia fiscal, se eu acreditasse que não fosse se transformar numa �panela� com direito a censuras e coleguismos políticos, eu diria que o ideal seria que todas as empresas pagassem integralmente seus impostos ao Governo Federal e este sim fizesse o repasse e divisão da verba ao teatro, ao cinema, às artes plásticas, à música, ao circo, em partes iguais (afinal cada arte dessas tem um nível de visibilidade completamente diferente da outra e sempre vai ser mais rentável para as empresas investirem na de maior alcance) e selecionando os projetos por suas propostas artísticas e não comerciais. Mas infelizmente não acredito que o Governo Federal esteja preparado para isso.
Letras: O que mais lhe agrada no �fazer teatral�?
Lucianno: Além de poder me comunicar, eu diria que é a delícia que é encontrar as pessoas certas, descobri-las durante o processo e deixar-me descobrir por elas, teatro é conhecer pessoas, idéias e vidas, e da junção delas emergir um acontecimento. A comunhão entre pessoas. Primeiro entre os fazedores teatrais: autor, diretor, atores, técnicos, produtores... Depois, destes todos com o público que comunga o teatro, o recebe no corpo para entrar na alma. Para mim o teatro é este encontro, assembléia, rito, e como artista me interesso em provocar o público, o levar à reflexão, mexer com seus instintos e ideologias, tirá-lo da comodidade. Me agrada o riso nervoso, o incontrolável, não o riso pela graça apenas. Não acredito no teatro como entretenimento ou lazer, não para mim, mas respeito quem acha o contrário e o faz com sinceridade.
Letras: Que �dica� daria a quem está começando a trilhar os caminhos da dramaturgia?
Lucianno: Buscar sua verdade, sempre. Gostem as pessoas ou não. Colocar sua verdade essencial no que faz, fazer só aquilo que realmente acredita. E daria então duas dicas que formam uma grande contradição: uma é mostrar seu trabalho, sempre, no máximo de ocasiões que forem possíveis, e permitir que o público se coloque, dialogar com ele; e a outra é, parafraseando algo que li do Gerald Thomas nos anos 90, não dar ouvidos às opiniões sobre sua arte, não se levar pelas críticas ruins, nem os bons elogios (o que é diferente do incentivo). Seguir no que se acredita, porque só assim se pode construir um trabalho verdadeiramente autoral, pesquisar-se e escrever o que se deseja de verdade, achar o essencial. E quanto mais fundo se vai nisso, mais belo é, ao meu ver. Conseguir seguir as duas dicas deve ser uma ótima idéia. Ainda acho que a sinceridade de ser quem se é de fato, é o melhor caminho para o Homem.
Letras: Quais são suas expectativas artísticas com sua mudança do Rio para São Paulo?
Lucianno: A primeira delas é mostrar meu trabalho teatral, e comecei muito bem lendo duas peças com vocês no Letras Em Cena, com quatro atrizes maravilhosas e amigas queridas (Denise Del Vecchio, Fernanda Azevedo, Maíra de Andrade e Renata Jesion). Acho que foi uma entrada com pé direito no palco paulistano. Agora é me concentrar e batalhar a encenação destas e outras peças, estabelecer contato com a classe paulistana, conhecer outros dramaturgos, e diretores, atores, produtores. Produzir nosso trabalho é sempre o mais difícil (e de certa forma desesperador às vezes), espero conseguir fazer isso aqui em São Paulo em breve e com boas parcerias. Outra expectativa é poder fazer teatro aqui, no Rio, pelo Brasil, por qualquer lugar: espalhar meu teatro pelo mundo, me espalhar por aí. Porque meu teatro sou eu. Além de querer dialogar com outras artes: como a ópera, o audiovisual, as artes plásticas e a literatura. E peço que Baco não me deixe faltar o vinho da paixão para continuar nessa luta da vida.

2 comentários:

São disse...

É bom saber do teatro brsileiro, tão bem servido de gente com qualidade.

Se for viável, separa os parágrafos e utiliza letra mais grada, sim? Meus olhinhos ficarão eternamente gratos pela caridade.
Abraços, Fernando.

Lucianno Maza disse...

Fico muito feliz com sua homenagem querido amigo do outro lado do oceano! Grande abraço e evoé!