Eis um espaço de partilha para gente que se interessa por teatro e outras artes. Podemos e devemos partilhar: fotos, reflexões, críticas, notícias diversas, ou actividades. Inclui endereços para downloads. O Importante é que cada um venha até aqui dar o seu contributo. Colabore enviando o seu texto ou imagem para todomundoeumpalco@gmail.com

quinta-feira, dezembro 04, 2008

Agayola, Absurda Comédia - Alfredo Correia


“AGAYOLA” é um espectáculo de Teatro, que o autor diz ser, uma absurda comédia!
O encenador, talvez por desconhecer este género de escrita, entendeu, que os personagens deviam ter cabeças absurdamente cerebrais, argamassadas de artifícios, envolvidas por cabelos de penteados colantes por onde o texto sai, ora esquisito ora palermóide, o que, ao serem expelidos, os espectadores sintam o odor saboneteiro, provocando um ataque de riso, - do chamado nojo de três dias - ou, fazê-los andar por aí a apitar finais avisos de correio azul, o que, diga-se de passagem na passadeira, que nem o Senhor da última cena, gostará que tal aconteça, pois como se sabe, pode até levar à paralisia do aparelho farlapiante.
Para o treinas-encena, é francamente positivo, para os intérpretes, é um exercício excelente, e para o autor, é um sofrimento quando sabe do corte - e - cose, o que, pode até fazê-lo recorrer à caixa de ponto que não temos, e daí, apresentar queixa, à sade social clubística dos autores absurdos.
Ora, Teatro com fregueses não é notícia ! Notícia é quando nas plateias, há menos espectadores que intérpretes.
Valha, nestas situações, os santos que vão a todas e os colegas de carteira, para que assim possa acontecer Teatro nas tábuas de um palco
Por falar em tábuas, recordo, que a indústria do plástico se tem desenvolvido de forma assustadora, o que, originou quase o colapso da madeira por causa do caruncho provocado pelos bichos- carpinteiros, e por isso, já não se fazem gaiolas em condições, como as de antigamente.
Perderam-se muitos ofícios correlativos, e não há cursos de formação de artífices cuja especialidade, é o trabalho manual.
Por isso, o Costa, que diz ser de Gaia mas não é gaioleiro, não dar saída aos impostos pedidos, que os Jotas lhe ordenam, mesmo com os ordenados em atraso, a fazer gaiolas uma atrás da outra.
Porém, com uma disciplinar justiça, o Costa, afirma que só tem duas mãos, o que é verdade, pois podemos testemunhar que não é maneta.
Tem duas mãos, que por sinal se tornam maneirinhas, quando dá um banho de sabão... e mais não posso contar, por causa dos direitos de opção.
Apenas vos posso dizer, e à sucapa do autor, que o Reinaldo é namorado da Rosinha, que os Jotas são os pais da Rosa, que Dª. Amélia é avó da Rosa Maria, que a Rosa tem uma passarinha na gaiola, que a gaiola desapareceu, e ainda, que o Costa é criado para todo o serviço.
No final aparece um Senhor que nem o autor sabe quem é.


ELENCO:

JOSÉ PINTO GOMES /OLÍVIA MARTINS /IRENE MAGALHÃES /LOURDES COSTA /CESÁRIO COSTA /ADRIANO FERNANDES

Participação Especial ANTÓNIO PEIXOTO
Operadora de Som - Mariana Correia
Montagem e Operação de Luz - Tiago Marques
Postiços - Beatriz Ferreira e David Ferreira
Adereços e Guarda Roupa - da Companhia
Carpintaria de Cena - António Peixoto
Montagem da Sonoplastia - Filipe Luciano
Espaço Cénico, Desenho de Som , Luz e Encenação - Alfredo Correia

Produção da Companhia Teatral de Ramalde, da Associação 26 de Janeiro - Fevereiro de 2009

quinta-feira, novembro 27, 2008

FESTIVAL AMASPORTO INICIA A 29 DE NOVEMBRO

O festival Amasporto arranca este fim de semana com o espectáculo "Bar dos Lilazes", textos de Bernardo Santareno e encenado por Alfredo Correia ACGITAR-Jovim/Gondomar, com 2 prólogos , um excerto de uma peça de Jacinto Lucas Pires e o outro prólogo, o Poema "Loucura de um Poeta" de Fernando Peixoto.

Ás 21.45h na sala da Companhia Teatral de Ramalde da Associação 26 de Janeiro

NÃO PERCAM!!!

terça-feira, novembro 04, 2008

Crítica por Pretérita Pessoa

“Os Estados Eróticos Imediatos de Sören Kierkgaard”

de Agustina Bessa Luís

pelo Seiva Trupe

Direcção de Roberto Merino

Desta peça, Carlos Porto (1930-2008) crítico teatral especialmente ligado ao Porto e aos grupos mais antigos da cidade, nos quais o Seiva Trupe honrosamente se inscreve, provavelmente acentuaria – como em muita da sua produção crítica, sendo um exemplo a generosa menção a Cenas da Vida do Príncipe Hamlet, encenação de Roberto Merino com alunos da ESAP no FITEI 2004 – as qualidades e o trabalho específico de cada um, sejam pessoas ou elementos que constituem a peça.

Provavelmente Carlos Porto falaria de Paulo Calatré, e de como este tão claramente somatiza o tormento de Kierkegaard na sua caracterização do filósofo, fazendo um homem que carrega uma corcunda como, simbolicamente, um peso; e falaria também da presença ágil e voz desenvolta de Jorge Loureiro, num D. João vexado e apoquentado; e mencionaria também a impressionante segurança da Tia, de Clara Nogueira, com a força necessária para dar luta ao protagonista, sedutor que se descobre.

Também o crítico não descuraria falar da ingenuidade patética, em especial na face e voz, da personagem de Miguel Rosas, esse Frederick, para sempre putativo noivo da Regina Olsen de Isabel Nunes, vibrante na sua primeira aparição, ao piano, num silêncio incomportável perante Kierkegaard, com o corpo e os olhos em tensão como que numa espera inquieta de poder falar.

De certeza que Carlos Porto também referiria Hugo Sousa, companheiro do filósofo, libertino mais libertino que Kierkegarard, sem os remorsos e com o orgulho que tão bem demonstrou no modo desabrido com que falava da sua relação com a actriz representada por Anabela Nóbrega, uma Julieta de quarenta anos; a voz de Anabela Nóbrega não deixaria por certo de merecer que se lhe sublinhasse a beleza do timbre.

Parece-nos também evidente que o decano dos críticos não deixaria por dizer que as Criadas Carolina Sousa, Juliana Rodrigues, Lizete Pinto, Vânia Mendes e Vera Pitrez representaram na perfeição – em uma espécie de coro – a seduzida sedutora, cada uma com um tom diferente como as diferentes situações onde cada qual languidamente enunciou ser abordada pelo filósofo. O mesmo Kierkegaard que nesta peça gostava da companhia das criadas e era inseparável do seu guarda-chuva - esse pretexto tão bom como outro qualquer para enredar uma criada que poderia não ter noivo ou namorado e se encontrasse a passear o cãozinho dos senhores.

Carlos Porto haveria também de falar do acerto dos figurinos de Manuela Bronze, na sua sugestão de toda uma época sobretudo pelas cartolas dos homens assim como pelas toucas das criadas, elemento este tão citado de atracção e maldição; e da cenografia de Acácio de Carvalho também falaria, dizendo por certo da sua versatilidade – por um lado – dos módulos metálicos, como da opulência visual dos panos vermelhos em fundo, que, como teatrais cortinas de uma teatral invocação de máscaras e mitos, estão presentes sempre para só se fecharem em conclusão.

A luz de Roberto Merino e Davide da Costa levaria, decerto, a falar da penumbra final que o é também na vida da personagem central, em jogo com a luz da chama no livro que arde no fim; o desenho de som de José Prata e Daniel Santos que tão bem pontua passagens e memórias (como o caso do D. Juan de Mozart ouvindo-se em fundo, na mais plena assunção do carácter sedutor de Kierkegarard) ou presságios (no esvoaçar da ave, quase um arranhar) também seria mencionado.

E a direcção de Roberto Merino seria com certeza relevada nas palavras de Carlos Porto por concentrar em pouco espaço e pouco tempo (menos de hora e meia) várias vidas e uma em particular, a do protagonista, que vai do orgulho à queda: em dinâmicas movimentações de cena e de objectos cenográficos, criando vários cenários que multiplicam a sala, e lhe dão - como em especial com o uso da porta que o era para a rua, o jardim ou, simbolicamente, para uma saída a que Kierkegaard se furtava – dão o paralelo justo às tensões que intensas sucederam às não menos intensas seduções entre as personagens.

Talvez o dissesse Carlos Porto, crítico nobre e generoso na sua atenção. Talvez muito provavelmente o fizesse. E nós assinaríamos por baixo.

Nuno Meireles

Festival Amasporto

Todos os anos, como já é tradição, publicamos aqui o programa do Amasporto. Este ano fazemo-lo de forma ainda mais especial. A edição deste ano do Amasporto é um tributo a Fernando Peixoto (anteriormente laureado com o Prémio Talma). Todos os anos o seu fundador, Alfredo Correia, deixa uma mensagem aos participantes. Abaixo poderemos ler a mesma e o programa completo do festival.


Companheiros,
Ainda está muito fresca a memória que temos de Fernando Peixoto, e estou certo, que se vai manter para todo o sempre.
Fernando Peixoto, para além de ser um companheiro solidário e um Amante apaixonado pelas coisas, e causas, dos Amadores de Teatro, deixou-nos imensos registos de saberes e conhecimentos, com os quais, podemos aprender a estar com a vida do Teatro.
Companheiro e Amigo Fernando Peixoto
Quero dizer-te, que és um Lobo do Mar, deste imenso oceano, chamado Teatro, e que ,muito fizeste para que os Amadores possam manejar melhor os remos da sua embarcação.
Quero dizer-te, que no barco do Amasporto, está um leme com o teu nome gravado, e de que tanto se orgulha o Talma.
Quero dizer-te, que o teu nome tenho-o escrito numa pedra, que guardo bem no fundo das águas do meu peito.

Aceita um abraço fraterno e solidário, com respeito e admiração.
Aos Companheiros deste Amasporto e a todos os 1995 participantes que por aqui passaram, permitam-me incluir, os vossos votos de pesar nesta lembrança singela, a um dos mais ilustres membros da nossa Família Teatral Associativa.
Paz à tua alma e aceita o nosso aplauso

Sempre
Alfredo Correia





PROGRAMA AMASPORTO


1º) - 29 de Novembro
“BAR DOS LILAZES”, textos de B.Santareno- Enc.Alfredo Correia
ACGITAR-Jovim/Gondomar

2º) - 13 de Dezembro
“CAFÉ VALENTIM” ,textos de Karl Valentim - Enc.Victor Valente
COMPANHIA DO JOGO -Albergaria-A-Velha

3º) - 20 de Dezembro
“EM CASA DO MESTRE PATHELIN” - (sec.XV) - Enc.Dantas Lima
ASSOCIAÇÃO CULTURAL DE CHAFÉ - Viana do Castelo

4º) - 10 de Janeiro
“7 MULHERES e 3 PELES”,textos: Shakespeare, Gil Vicente e Lorca - Enc.Victor Valente
Grupo de Teatro ILUSÕES & LIMITADAS - Aradas/ Aveiro

5º) - 17 de Janeiro
“AQUI HÁ FANTASMAS”, de Henrique Santana – Enc. Luís Couto
TEATRO EXPERIMENTAL MAGNETENSE-Lousada

6º) - 24 de Janeiro
“O TRIUNFO DAS PERSONAGENS”,de Casimiro D.Simões;
“O CONSULTÓRIO” e “O POÇO”, de A.M. Pires Cabral
GRUPO PAROQUIAL DE TEATRO DE LEÇA-Leça da Palmeira/Matosinhos

7º) - 07 de Fevereiro
“AGAYOLA” , de Alfredo Correia
COMPANHIA TEATRAL DE RAMALDE- Porto

LOCAIS A INDICAR –ESPECTÁCULOS AOS SÁBADOS PELAS 21,45 HORAS

Dia 08 de Fevereiro – 16 horas
CERIMÓNIA DE ENCERRAMENTO-Auditório Paroquial da Igreja de Ramalde
Entrega das Placas Associativas aos Grupos Participantes
Atribuição dos “PRÉMIO TALMA”

TRIBUTO A FERNANDO PEIXOTO

Actor,Encenador,Historiador,Teatrólogo,Escritor, Dramaturgo,Professor e Poeta
-Prémio Talma 2000-
(N.25 Julho 1947 –F.03 OUT.2008)

Colaboração de Helena Peixoto (filha), Manuel Ângelo, Roberto Merino,Sérgio Marques,Francisco Santos
e do músico/actor, da C.T.Ramalde – David Ferreira

Encenação do Poema “A LOUCURA DO POETA” – excerto de uma cena,
da peça “BAR DOS LILAZES” (2008, enc. Alfredo Correia),
pelo Grupo de Teatro ACGITAR-Jovim/Gondomar



quinta-feira, outubro 30, 2008

"Estados eróticos imediatos.." Mais uma encenação de Roberto Merino

"Estados eróticos imediatos de Sören Kierkegaard”, de Agustina Bessa-Luís, estreou no Teatro do Campo Alegre, no Porto. Uma história que cruza o protagonista, o filósofo dinamarquês Sören, com o rei D. João.

A peça, da companhia Seiva Trupe e que vai estar em cena até 31 de Outubro (amanhã), desenrola-se em Copenhaga, capital da Dinamarca, durante o século XIX. Roberto Merino, professor na ESAP, encenador, define a peça como um “encontro fictício entre D. João e Sören”. O rei de Portugal descobre a obra do filósofo por mero acaso e coloca-a em questão. No entanto, o tema central da peça é uma das fases mais marcantes da vida de Sören - o seu amor, entrega e renúncia da sua amada Regina Olsen.

“É um excelente exercício de diálogo teatral, mas, ao mesmo tempo, um desafio conseguido”, disse Roberto Merino. O encenador confessou mesmo ter tido algumas dificuldades na transposição do texto para a acção. “A Agustina é romancista e não tem todas as ferramentas teatrais que um dramaturgo tem”, disse. Uma obra de época que abre ao espectador a vida de Sören, com alguma ironia à mistura. O encenador salientou ainda a importância de “conhecer o outro lado do filósofo, o lado mais humano”. Um homem que na obra de Agustina é classificado como “um génio numa cidade de província”. Na realidade, apesar de ter estado fortemente ligado à filosofia, à teologia, à psicologia e à literatura, Sören Kierkegaard teve um único e grande amor, Regina Olsen, que conheceu aos 22 anos e por quem se apaixonou de imediato. Chegaram a ficar noivos, mas foi o próprio Sören quem acabou com o noivado, sem haver, até hoje, uma razão conhecida para tal decisão.

O cenário, marcado pela quase ausência de luz, contêm quatro prateleiras, com vários objectos de diferentes significados. “Representam ideias, o erotismo, a infância, objectos criados para estarem ali, enquanto o diálogo está a decorrer e que nada têm de realistas”, explicou Roberto Merino.

Agustina Bessa-Luís comemora o 86º aniversário a 15 de Outubro, pelo que, a partir desse dia e até ao final do mês, a Seiva Trupe promove uma homenagem à escritora portuense. Antes de cada exibição, serão lidos excertos das suas obras. Até ao momento, foram convidadas algumas figuras públicas do Porto, mas não há ainda confirmação.

O livro “Estados eróticos imediatos de Sören Kierkegaard”, lançado em 1992, é a primeira obra de Agustina Bessa-Luís que a companhia Seiva Trupe faz chegar ao teatro.

O professor Fernando Peixoto recomendaria, com certeza, este espectáculo Teatral a todos vocês..


P.S - quem tiver fotos do espectáculo que avise..

segunda-feira, outubro 13, 2008

"RE-PARTINDO..."

Andava a pesquisar na internet quando encontrei mais uma homenagem ao professor Fernando Peixoto. Existem bastantes blogs onde ele é falado, lembrado e homenageado, mas este chamou-me a atenção pela seguinte razão, dizia que este seria o último poema escrito pelo professor Fernando Peixoto.

« RE-PARTINDO... »

Sei que contigo vão partir
memórias de um tempo partilhado,
dias breves que hoje são passado
e podiam no entanto ser porvir.

Sei que levas na bagagem a lembrança
dos olhos nimbados de tristeza
mas também o brilho da bonança
que alimenta a tua natureza.

Mas se partes, apenas uma parte
vai contigo rasgando o mar e o vento:
que outra parte de ti já se reparte
na minha memória e pensamento.

24 de Agosto de 2008
© Fernando Peixoto


Miguel

sexta-feira, outubro 03, 2008

Para si... Amigo


Ainda agora partiu e já sentimos tanto a sua falta.
Ainda ontem falamos de si, o professor que tanto nos ensinou, não só História do Teatro, mas a ver o mundo com outros olhos. O amigo que sempre foi e SERÁ, que sempre esteve lá quando foi preciso e nos ajudou a vencer.
Muitas vezes nos rimos... Demos gargalhadas tão alto que as pessoas que passavam deviam-se perguntar o que é que se estaria a passar dentro daquela sala de aula. Eramos felizes ali dentro... Também tivemos os nossos momentos de angústia, de raiva, de tristeza. Mas ultrapassamos isso tudo e passado um bocado já nos estavamos a rir outra vez. É com um sorriso que o recordo. É com um sorriso que o levo no coração. É com um sorriso que o vou ter, meu amigo, para sempre na memória.
Adeus meu amigo. Adeus. Com uma lágriama a escorrer-me pela cara... Adeus

EM NOME DE TODOS AQUELES QUE TE AMAM, CADA UM À SUA MANEIRA

Miguel

segunda-feira, junho 30, 2008

DRAGÃO 7 NO «FAZER A FESTA»

O FAZER A FESTA (festival de teatro do Art'Imagem) deste ano, saldou-se pela apresentação de bons espectáculos, mostrando que o agrupamento do Porto não se furta a melhorar, de ano para ano, a qualidade do seu Festival.

Entre 25 de Abril e 4 de Maio, foram dezenas os grupos nacionais e estrangeiros que passaram pelos espaços dos jardins, da Capela, do Auditório da Biblioteca e da Tenda do Palácio de Cristal.

Na impossibilidade de analisarmos aqui o conjunto desses espectáculos, não podemos deixar de realçar aquela que, para nós, foi a maior surpresa.

Entre os espectáculos apresentados, contava-se o Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente.

Foram 3 as companhias que trouxeram esse espectáculo ao Festival: 2 portuguesas e uma brasileira: o «Dragão 7».

Era previsível que aguardássemos com expectativa as diferentes versões, mas jamais imaginaríamos que um grupo do Brasil pudesse surpreender-nos da forma como o fez o DRAGÃO 7.

Com efeito, não apenas vimos aquele que foi, para nós, o melhor espectáculo do Festival, como ficamos verdadeiramente encantado com a leitura (fiel e correcta) de Gil Vicente.

Sublinhando os aspectos mais cómicos do texto, o DRAGÃO 7 apresentou-nos um verdadeiro show de bom teatro. Os figurinos foram concebidos com grande rigor e a encenação proporcionou uma leitura e uma movimentação plástica que conferiram à representação uma frescura e uma alegria verdadeiramente contagiantes, possibilitando, inclusive, a participação do público, frequentemente chamado à cumplicidade pelos próprios actores e atrizes.

Desde os Diabos a Joane, do Judeu ao Enforcado, as diferentes personagens foram-se desdobrando pelos actores e actrizes do elenco sem que houvesse a menor perda de ritmo.

Assim, o clássico vicentino apareceu-nos numa moldura modernizada e plena de actualidade (o tema da morte e do pecado atravessa todos os tempos), convergindo na encenação alusões aos dias de hoje e utilizando de forma bastante criativa o espaço cénico (um auditório em anfiteatro), com os actores distribuindo-se pelos diferentes lugares da sala e mesmo no interior das filas onde o público (a princípio um pouco tímido face àquela aposta inesperada) acabou rendendo-se à alegria contagiante das personagens e às musicas de melodias conhecidas ou de sabor carnavalesco tipicamente brasileiro.

Foi uma verdadeira osmose entre Portugal e o Brasil: um Gil Vicente português com sotaque brasileiro e um grupo de brasileiras e brasileiros respeitando a herança cultural sem deixar de introduzir um toque de modernidade realmente encantador.

Muito poderia dizer-se sobre este espectáculo. Mas bastará dizer-se que, no final, os espectadores (nos quais se incluíam crianças e muitos jovens) de uma sala cheia estavam verdadeiramente rendidos ao magnetismo tropical dos nossos irmãos, trazendo até nós um grupo de excelentes actrizes e actores, senhores de uma expressão plástica e corporal notáveis e utilizando as vozes de tal forma que nehuma palavra se perdia, mesmo levando em linha de conta que o texto fora representado com a linguagem do século XVI.

Oxalá possamos ver mais vezes o DRAGÃO 7!
Fernando Peixoto

segunda-feira, junho 09, 2008

O QUE EU ESPERO DO TEATRO


Falando de Peter Brook, o actor/encenador/pedagogo João Mota, conta que:
«Peter Brook fazia muitas vezes uma pergunta que não vem em livro nenhum:
― Quando um grupo de pessoas se encontra numa estação de caminhos-de-ferro, há umas que partem e outras que chegam, mas há uma necessidade de lá ir ― vai-se lá buscar alguém ou vamos despedir-nos de alguém; quando vamos ao restaurante, há uma necessidade de comer; quando vamos ao teatro, qual é a necessidade? [sublinhado nosso]
[1].
Quando lia a recente edição portuguesa de O Espaço Vazio, de Peter Brook, veio-me à memória um conjunto de discussões que ultimamente tenho travado com alguns amigos sobre a essência do teatro. E, na maior parte das vezes, estamos em desacordo. Pela simples razão de que continuo a pensar que a arte teatral só existe e se justifica quando se estabelece um «diálogo» entre o actor e eu/espectador.
João Mota, citando Brook, pergunta precisamente aquilo que muitas vezes me tem assaltado: que vou eu fazer ao teatro? Qual é a minha necessidade?
Quando vou a alguns teatros, sento-me confortavelmente em cadeiras (algumas de veludo) e gasto algumas horas vendo actores em movimento, falando, falando, como se falassem consigo mesmos ou apenas estivessem pensando em voz alta, muitas vezes parecendo mesmo terem caído ali por estranho acaso, mas dando a nítida impressão de nada terem a ver uns com os outros e muito menos com o espaço que ocupam. Ou então proferindo frases espaçadas sem qualquer lógica, debitam palavras que nada têm a ver com a vivência do quotidiano do comum dos mortais. Muitas vezes adormeço!
Não me parece que o sucesso do teatro na Grécia antiga fosse consequência da afluência de um público especialmente preparado para ver teatro. Todos sabemos que o público do teatro desse tempo era cultural e socialmente bastante heterogéneo e, todavia, também ele participava nas votações para a classificação dos vencedores dos concursos de tragédia. Os prólogos das peças gregas e romanas mostram-nos bem como os autores procuravam sensibilizar a atenção do público para os seus trabalhos.
Hoje, parece que o drama, a comédia e a tragédia estão fora de moda e o que está a dar é precisamente construir textos e espectáculos que inventem uma realidade que ainda não é a nossa, ou seja, espectáculos que sendo incapazes, por si próprios, de motivarem a atenção e a reflexão do espectador, são vestidos com um tom de falsa declamação, completamente artificial e revestidos o mais possível com grandes efeitos cenográficos, luminotécnicos, ou sonoros.
«A imaginação é um músculo». Esta frase é também de Peter Brook, o mesmo que jamais se inibiu de montar os mais exigentes espectáculos em espaços vazios onde, à partida, a maioria dos encenadores diriam que era impossível montar um espectáculo. Mas, como Brook, também Augusto Boal provou, sem margem para dúvidas, a possibilidade de montar espectáculos no interior das aldeias índias, no meio confuso de um supermercado ou no espaço em movimento de um comboio.
Depois disto, é caso para questionar: quando vou ao teatro, exercito o músculo da imaginação? Se for «encandeado» pelo brilho dos efeitos especiais, é óbvio que a minha atenção fica presa a eles, desaparece o diálogo que o actor deveria travar comigo e fenece em mim qualquer apetite de reflexão.
Quando hoje em dia se vêem grandiosas montagens de Shakespeare, esquecemo-nos dos limitados recursos de meios e de espaço de que se servia Shakespeare e os seus contemporâneos para fazerem aparecer o «Espectro» dialogando com «Hamlet», tal como não havia mar na cena. Muito do que se dizia e representava, resultava do trabalho da imaginação que a obra e os seus fautores (do autor ao ensaiador, dos artífices aos actores) solicitavam ao público. E nem por isso o teatro isabelino deixava de atrair multidões. Não admira: as tragédias gregas nunca necessitaram de derramar sangue em palco para que os espectadores percebessem e se condoessem com as personagens que tinham «morrido» entre cenas.

UM ESPECTÁCULO A RECORDAR

Há pouco mais de duas semanas fui atraído por um espectáculo que para mim era uma verdadeira incógnita, ainda pelo facto de se tratar de um aproveitamento de textos de Brecht adaptados para teatro pelo Teatro Arado em co-produção com o Espaço T: As Histórias do Senhor Keuner.
A sala do Cine-Teatro Brasão estava a pouco menos de metade da sua lotação e, como mais tarde deduzi, grande parte dos espectadores eram constituídos por familiares e amigos das actrizes e actores que integravam o espectáculo.
Confesso desde já que não estava minimamente preparado para ver este espectáculo e nem me dei ao cuidado de ler a capa do programa (um modesto A4 dobrado) que definia «aquilo» como Teatro de Integração Social e Comunitária.
Por isso, logo nas primeiras aparições dos actores os meus olhos «viciados» notaram que havia ali algo de estranho. Eles não falavam como os «outros», não se movimentavam como os «outros» não olhavam como os «outros». Mas, curiosamente, parecia haver algo de indefinido que fazia com que se relacionassem entre eles de uma forma natural. O contacto físico era de grande espontaneidade; partiam de um movimento para o outro como quem vai da cozinha para a sala de jantar, impulsionados por uma palavra ou por um som musical.
Nas falas das actrizes e actores notava-se que havia algo de diferente em relação ao que estamos habituados a ouvir nos actores profissionais. Mais lentidão, por vezes, como se houvesse algumas dificuldades de articulação nas palavras, subidas e descidas de voz que pareciam menos ensaiadas que sons saindo do interior de cada um deles. Também os movimentos eram claramente diferentes daqueles que se ensinam no teatro profissional: os passos pareciam obedecer mais ao instinto do que a qualquer mecanização programada pela encenação, mas não deixavam de partilhar, de forma harmónica, os espaços que os separavam. Depois… bem, depois «escutei» silêncios inesperados e longos que me provocavam sucessivas interrogações.
Quem era esta gente? Como haviam chegado ali? O que os tinha motivado para este espectáculo?
E, o mais surpreendente: a coreografia desenvolvida parecia estar em perfeita harmonia com uma aparente falta de jeito para o ballet. Mas seria isso que se procurava? E, quando se ocultavam como uma massa informe, sob um enorme pano, faziam-no de forma tão convincente que eu me quedava numa ansiosa expectativa: que virá a seguir?
Lentamente fui-me apercebendo do que se passava, do que se pretendia transmitir, da exiguidade de recursos que amplifica a imaginação, e dei por mim surpreso perante aquilo que contemplava. E não adormeci !
No final tive a oportunidade de conviver durante alguns instantes com as actrizes e actores que participaram no espectáculo: e senti-me feliz ao compartilhar das sonoras e alegres gargalhadas de alguns deles, da forma desinibida como comunicavam, sem se importarem com os olhares de viés de alguns «vizinhos».
Eles tinham conseguido preencher um espaço praticamente vazio com uma arte reinventada, fruto da provocação que o grupo do Teatro Arado lhes fez.
E aconteceu TEATRO! Se não foi uma experiência nova, foi, pelo menos, original. E para mim foi altamente gratificante, recordando-me aquilo que Peter Brook escreveu:
«Para que alguma coisa relevante ocorra, é preciso criar um espaço vazio. O espaço vazio permite que surja um fenómeno novo, porque tudo que diz respeito a conteúdo, significado, expressão, linguagem e música só pode existir se a experiência for nova e original. Mas nenhuma experiência nova e original é possível se não houver um espaço puro, virgem, pronto para recebê-la».

É ISTO QUE EU ESPERO DO TEATRO!


NOTA ― O «Espaço T» surgiu no Porto, há quase dez anos, com o objectivo de redefinir a tradicional abordagem de ressocialização das minorias desfavorecidas e marginalizadas. Aqui convivem no mesmo espaço deficientes, toxicodependentes e pessoas "normais", recorrendo à arte como instrumento de terapia.


(Texto publicado em Que Cena, n.º 1-Primavera-2008)


FERNANDO PEIXOTO


[1] ― BROOK, Peter ― O Espaço Vazio. Lisboa: Orfeu Negro, 2008, p. 213.

NOTÍCIAS-JUNHO 2008



PUNHAL NA CARNE
de Júnior Sampaio
no Teatro do Campo Alegre
10-06-2008 a 29-06-2008


Co-produção do Seiva Trupe e ENTREtanto Teatro, a partir de "Como Um Punhal nas Carnes", de Maurício Kartun, com tradução de António Rebordão Navarro, adaptação, dramaturgia e encenação de Júnior Sampaio, interpretação de Clara Nogueira e José Fragoso, cenografia de Júnior Sampaio e Vítor Sotto-Mayor, desenho de luz de Wilma Moutinho e figurinos de Júlio Waterland.
Um texto, inédito em Portugal, que confronta a força e fraqueza da paixão arrebatadora. Um casal: as suas paixões extraconjugais. Delírios, desejos, esperanças, fantasias, sonhos, sofrimentos, feridas, angústias, desamparos, ressentimentos, desesperos, penúrias e enganos de que quem ama é vítima. A paisagem destruída de um casal depois da fúria devastadora da paixão (catástrofe natural que aflora a pele, inunda o corpo e reconstrói a alma).


O HOMEM SEM CARA
Teatro Art'Imagem
O Teatro Art’ Imagem irá apresentar “O homem sem cara” no auditório da Quinta da Caverneira, Águas Santas, Maia.
Este espectáculo estará em cena em Junho nos dias 12, 13 e 14 às 22h00 e no dia 15 às 16h00.
Destina-se a maiores de 12 anos e o preço do bilhete é de € 3,00 (preço único).

Inf e reservas pelo tlf 96 020 88 19
Esta peça (num texto original da nova dramaturgia portuguesa e estreada em Novembro 2006), foi inspirada na história verídica de um homem que sofre um grave acidente onde perde parte do rosto. Depois de várias operações aceita fazer um transplante. É este o drama em que vive.
Spinoza levantou a questão de saber se um homem muito mutilado ainda podia considerar-se um homem
ficha artística:
texto e encenação de Fernando Moreira * figurinos de Marita Setas Ferro * cenografia de Ricardo Preto * música de Carlos Adolfo * interpretação de Ângela B. Marques, Pedro Carvalho e Valdemar Santos.
sobre a peça (texto do encenador):
Quando vi na televisão uma reportagem sobre um homem que perdeu parte da cara e ao mesmo tempo li as notícias sobre o primeiro transplante mundial de rosto senti que havia matéria suficiente para escrever uma peça de teatro.
Encontrei ainda informações bizarras quanto ao chamado progresso da ciência, isto é, o homem a quem fora feito o primeiro transplante de
mão pediu aos médicos para a removerem (porque a achava feia e grande demais);
o homem chinês a quem foi transplantado o pénis pediu para o retirarem (a mulher não aceitou o novo orgão).
Compreendi que havia algo de lírico e trágico no meio disto tudo. Afinal, quem sofre mais: o acidentado ou as pessoas que lhe são próximas? Quem é, e quem foi a pessoa que doa o rosto? Como se aguenta psicologicamente o transplante?
Chegámos às profundezas do ser e como sabemos que arte é reflexão e inquietação avançámos, sem medo, para este desvelar da alma.


DUELO
de Bernardo Santareno
O Grupo Cénico da Música Nova, dirigido por Vicente Batalha, apresenta, no seu Teatrinho de Bolso, em Pernes, Santarém, "O Duelo", de Bernardo Santareno, em ante-estreia, no dia 24 de Maio, às 21h30, e, em estreia, no dia 25 de Maio, à mesma hora. Os espectáculos seguintes terão lugar, a 31 de Maio, 1, 21, 22 de Junho, sempre às 21h30. O Grupo conta com apoios da Câmara Municipal de Santarém, da Junta de Freguesia de Pernes e da Rádio Pernes. A peça "O Duelo", de Bernardo Santareno, foi publicada em 1961, e só subiu à cena dez anos depois (1971), pela Companhia do Teatro Nacional/Amélia Rey Colaço-Robles Monteiro, com Eunice Muñoz, João Perry, Henriqueta Maia e Cecília Guimarães nos principais papéis.
Um elenco de 29 intérpretes dá vida ao espectáculo, assente no belíssimo texto de Bernardo Santareno: Ana Luísa Oliveira (Manuela), Bruno Oliveira (Ângelo), Dária Batista Costa (1ª Velha), Cláudia Henriques (Maria Clara), Filipe Henriques (1º Campino), Joana da Paz (1ª Rapariga), Jorge Paulino (2º Campino), Leandro Pedro/Carlos Vieira (Chico), Maria José Mendonça (Mariana), Maria Manuela Teopisto (Rosária), Maria Teresa Teopisto (Salomé), Pedro Gaivoto (Zé Ruço), Stany Gonçalves (José); e, ainda, Salomé Vieira (Prólogo), Ana Catarina Guerra, Fernando Caetano, José António Leal Teopisto, Mónica Frazão, Paula Gonçalves (Coro), os pequenos, Catarina Henriques, Diogo Frazão, Gabriel Isidro, Leonor Henriques e Ricardo Cintrão, e Vicente Batalha (figuração), completam o grupo e enquadram a acção.Na ficha técnica: Rui Henriques (cenografia), Souzel Vieira, Lubélia Caetano, Maria Aurora Caetano, Maria Emília Cipriano, Maria José Mendonça (guarda-roupa e adereços), COOPERSOM (luminotécnica, Heitor Mendonça, e sonoplastia, Bruno Talhão), e Valter Jesus (apoio de cena). A direcção e encenação de "O Duelo" é de Vicente Batalha, com assistência de Telmo Jesus.
"O Duelo", que alguns estudiosos classificam como "uma tragédia", faz parte do 1º ciclo da obra de Santareno – o "realismo poético" – à semelhança de, "O Lugre", "O Crime da Aldeia Velha", "António, O Marinheiro" (O Édipo de Alfama) e "O Pecado de João Agonia".
A acção passa-se na lezíria do Tejo, no lado de lá da ponte, para as bandas de Almeirim, e tem como pano de fundo o Santíssimo Milagre de Santarém. "O Duelo" trava-se entre os trabalhadores dos campos e os senhores da lezíria. A síntese dessa luta, está expressa, logo no 1º acto, quando a mãe Rosária, num grito abafado, diz ao filho Ângelo, "Eles são os senhores, filho, e a gente os servos, eles podem tudo e a gente nada".
De "O Duelo", disse o crítico João Gaspar Simões (in "Diário de Notícias", em 1961):
"Pela sua linguagem, que é bela, sobretudo na boca de Rosária e Manuela (também de Ângelo e Mariana) e pela sobriedade dos seus lances dramáticos, "O Duelo", quanto a mim, é das peças de Bernardo Santareno que, uma vez em cena, consagrarão definitivamente um dramaturgo já hoje, sem favor, dos mais altos expoentes da dramaturgia nacional."
Do autor, Bernardo Santareno, diz Luís Francisco Rebelo, em "O Teatro Português": "Oscilando entre os pólos (de sinal contrário, mas de força equivalente) de uma fascinação do mal e de uma obsessão de angelismo, o seu teatro realiza a inesperada fusão de temas de raiz popular com as preocupações existenciais mais fundamente sentidas na carne e no espírito do homem seu e nosso contemporâneo."
Texto extraído de Tinta Fresca, Jornal de Arte, Cultura & Cidadania, de 23 de Maio de 2008


O DUELO em Pernes Texto de Rosalina Melro
O Duelo, numa ousada e bem sucedida apresentação do Grupo Cénico da Sociedade Musical União Pernense, fez a sua ante-estreia no passado sábado, 24 de Maio, com a sala esgotada, a que também compareceu o presidente da Câmara de Santarém.
O Duelo é a única peça de Bernardo Santareno que tem como localização a lezíria e a gente da planície ribatejana. O conflito foca aspectos etnográficos, sociais e económicos, nos anos sessenta. A tragédia, pressentida desde a primeira cena, revela-se humana. Caso de amor e paixão, de honra e justiça, de crença e medos. Tudo caminhos que entrelaçam as personagens. De mestre é a direcção, a encenação e a participação especial de Vicente Batalha. Um trabalho que considero das mais significativas homenagens a Bernardo Santareno.
O espectáculo começa com o clássico Coro, que assume função muito particular na antevisão da tragédia. Justifica os aplausos tal ousadia. Há outras funções que, no espectáculo, assumem excepcional relevância: a sonoplastia e a luminotecnia nas mãos e na sensibilidade de Heitor Mendonça e de Bruno Talhão. A cenografia de Rui Henriques e o apoio de cena, sempre muito bem na sua simplicidade. Também o guarda-roupa e adereços merecem louvor pelo cuidado na escolha de modelos e na fidelidade à época.
Maravilhoso o elenco. Aplausos a todos: as mulheres do povo, as raparigas, os campinos, as velhas e aquela estranha feiticeira, tão confiante no seu diabo! Linda, na sua ingénua frescura, a Cláudia Henriques. A Maria José Mendonça faz uma Mariana de actuação muito decidida, sempre bem no desempenho de mulher trave da casa e amiga da mãe de Ângelo, a Rosária é a personagem mais trágica. Personagem excepcionalmente construída por Maria Manuela Teopisto.
Recordo que O Duelo foi escrito em 1961 e representado pela Companhia do Teatro Nacional, em 1971. Então, o papel de Rosária coube a Eunice Muñoz. Papel de elevada tensão dramática, representa uma vida de medo, temor, superstições, mistério e dor. Ela é a mater dolorosa e passa ao filho essa herança trágica.
Também muito forte o trabalho de Ana Luísa Oliveira: a menina Manuela, a patroa, a mulher dona das terras, dos cavalos e dos toiros, mas escrava de coração apaixonada por um servo, Ângelo, o filho de Rosária, o que aprendera, na mágoa da mãe humilhada: "Eles são os senhores, filho, e a gente os servos, eles podem tudo e a gente nada". Surpreendente, o desempenho de Bruno Oliveira, no papel de Ângelo até pela evolução do seu trabalho sobre o palco, aqui representa o homem do povo, o servo que iguala a patroa ao enfrentar o destino trágico. Herói porque herdeiro da tragédia.
Todos ouviram merecidos e prolongados aplausos.
In "O Ribatejo", de 31 de Maio de 2008

sexta-feira, maio 09, 2008

Beijamins - III FESTIVAL PARA A INFÂNCIA E JUVENTUDE














Beijamins III Festival para a Infância e Juventude
Peças de teatro e actividades dedicadas especialmente aos mais novos!

9Maio - 21h45 - Cine Teatro Eduardo Brazão
"A Menina e o Mar" - Clube de Teatro Atl. S. Vouga
"O Príncipe Nabo" - Dramático Flor Infesta
"Nuvem que não Chora fica Doente" - Grupo Aceno de Acenar M/6 Anos
10 Maio- 18h - Biblioteca Municipal de Gaia
Abertura da Exposição das Ilustrações de Roberto Chichorro
Lançamento do Livro "O Pássaro da Primavera" - M/6 Anos
16, 17, 18 Maio - Cine Teatro Eduardo Brazão
"O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá" - Teatro Arado
Horário: 16 Maio - 10h30 e 14h30;
17 Maio - 16h30 e 21h45;
18 Maio - 16h30
22 Maio - 16h30 - Parque da Lavandeira
Conversa à Sombra "O ensino artístico nas escolas"
Com Professores e Encarregados de Educação
Jogos de Expressão Dramática (levar fato de treino)
23 Maio - Auditório do Teatro Amador de Sandim (TAS)
"O Corta-Unhas" - Teatro Assombrado
Horário:10h30, 14h30 e 21h30
M/3 Anos
24 Maio - 21h45 - Cine Teatro Eduardo Brazão
"As Histórias do Sr. Kauner" - Co Produção Teatro Arado/Espaço T
"O Meu Caso" - ESAP 2º Ano Curso de Teatro
"A Ida para o Inferno" - ESAP 1º Ano Curso de Teatro
M/12 Anos
01 de Junho - DIA MUNDIAL DA CRIANÇA - Parque Biológico de Gaia
17,30 - Abertura da exposição das ilustrações de Roberto Chichorro
18,00 - Lançamento do livro O Pássaro da Primavera
02 Junho a 8 Junho - Auditório Parque Biológico
"O Pássaro da Primavera" - Teatro Arado
Horário:
2 a 6 Junho - 10h30 e 14h30
7 e 8 Junho - 16h30
M/ 3 Anos

ACTIVIDADES PARALELAS
09 Maio - Teatro Amador de Sandim (TAS)
Lançamento da Revista de Teatro Que Cena
Horário: 21h

23 de Maio a 07 Junho - Teatro Amador de Sandim (TAS)
21,00 - "Uma Vida no Teatro" -Exposição Documental de Homenagem a Fernando Peixoto
Horário: Inauguração da Exposição - 21h
Diariamente das 10h às 19h

Organização: Gaianima, E.M. e Teatroarado, A.C.

NOTÍCIAS DE TEATRO

História de uma gaivota
e do gato que a ensinou a voar
pelo ART'IMAGEM
na
BIBLIOTECA MUNICIPAL ALMEIDA GARRETT no Porto

5 a 15 de Maio8, 9 e 10 de Maio - 21.30h
10 e 11 de Maio - 16.00h

Uma gaivota, vítima da poluição de uma maré negra, confia o seu pequeno ovo a um gato, chamado Zorbas, pedindo-lhe para cumprir três promessas: não comer o ovo; cuidar dele até nascer a gaivotinha; e, por fim, ensiná-la a voar. Zorbas pede então ajuda a três amigos (Colonello, Sabetudo e Barlavento) para tentar levar a cabo a estranha missão de cuidar da gaivotinha. Depois de passarem por muitos perigos para cumprirem as duas primeiras promessas, eles têm que recorrer a alguém muito especial para os ajudar a cumprir a terceira - ensiná-la a voar ! Mas, para isso, têm que quebrar o tabu dos gatos...


Fest'Arte 2008

O Juíz das Borracheiras

Org. TAS - Teatro Amador de Sandim
Representação pelo Grupo Mérito Dramático Avintense, com encenação de Manuel Ramos Costa.
Horário21h30
Local: Sede da colectividade
Morada: Rua do Teatro Amador, 120 4415 Sandim - Vila Nova de Gaia
Telefone:22 7631286
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De 2008-05-08 a 2008-05-25
Eclipse Total
de Christopher Hampton
Pelo Teatro Experimental do Porto

Uma encenação de Norberto Barroca para a peça de Christopher Hampton, autor, dramaturgo, argumentista e realizador inglês nascido em 1946 na ilha açoriana do Faial, quando o pai, engenheiro, lá trabalhava. Hampton fez carreira no teatro, televisão e cinema, e foi nomeado em 2008 para o Óscar de melhor argumento adaptado por "Expiação". Tem sido, igualmente, autor de vários argumentos, como "Casa de Boneca", "O Cônsul Honorário" ou "Ligações Perigosas".

"Eclipse Total" foi adaptada ao cinema pelo próprio, num filme dirigido por Agnieszka Holland, com Leonardo Di Caprio e David Thewlis. Protagonizada em Gaia por Fábio Alves e Pedro Lamas, a peça aborda as vidas de dois dos maiores poetas franceses, Rimbaud e Verlaine, o seu relacionamento, a sua intervenção polémica e tempestuosa no Século XIX e os seus reflexos até aos dias de hoje.
Tradução, encenação e cenografia de Norberto Barroca
Figurinos e co-autoria de cenografia de Mário Dias Garcia
Desenho de Luz e Sonoplastia de Eduardo Brandão
Interpretação de Fábio Alves, Pedro Lamas, Adriano Martins, Ângela Marques, Aquiles Dias, José Cruz, José Dias, Margarida Machado, Olga Dias e Susana Sá
Org. Pelouro da Cultura, Património e Turismo/Auditório Municipal/TEP/ Gaianima
Horário: de 4ª a Sábado às 21h45 Local: Auditório Municipal de Gaia
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Já saiu o

Nº 33 de Teatro/CELCIT

Revista de teatrología, técnicas y reflexión sobre la práctica teatral iboamericana
A tu disposición en la sección Publicaciones de www.celcit.org.ar
Tres nuevos textos teatrales en www.celcit.org.ar Tres nuevos textos teatrales, de lo mejor de la dramaturgia iberoamericana contemporánea, a tu disposición en la sección Publicaciones/Dramática Latinoamericana de www.celcit.org.ar ;
desde allí podés bajarlos a tu PC, sin cargo alguno.Ya son más de 270 los textos publicados, procedentes de Argentina, Bolivia, Brasil, Chile, Colombia, Costa Rica, Cuba, España, Francia, México, Perú, Portugal, Puerto Rico, Uruguay, Venezuela... Los nuevos textos son:275. La confesión de un hijo de puta. Paco Sanguino y Rafael González (España)276. Doscientos veinte voltios. Víctor Winer (Argentina)277. Las películas de invierno. Juan Mayorga (España)

Últimos títulos publicados:
255. A ver un aplauso. César de María (Perú)
256. Passport. Gustavo Ott (Venezuela)
257. Ignacio & María. Mara Mansur (Cuba)
258. El último barco. César de María (Perú)
259. Pony. Gustavo Ott (Venezuela)
260. Charlotte Corday. Nara Mansur (Cuba)
261. Arritmia. Leonel Giacometto (Argentina)
262. Tolstoi. Ricardo Prieto (Uruguay)
263. Tren hacia la dicha. Amado del Pino (Cuba)
264. El zapato sucio. Amado del Pino (Cuba)
265. El sueño de Dios. José Luis Arce (Argentina)
266. La niña que moría a cada rato. José Luis Arce (Argentina)
267. A paso lento. Gracia Morales (España)
268. Alcanzar el unicornio. Guillermo Schmidhuber (México)
269. Alicia. Raquel Diana (Uruguay)
270. Café de lobos. Jorge Ricci (Argentina)
271. Cuadros de humor. José Luis Alonso de Santos (España)
272. Cuentos de hadas. Raquel Diana (Uruguay)
273. Cloro. Víctor Winer (Argentina)
274. En busca de un hogar sólido. Guillermo Schmidhuber (México)
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Auto da Razão (Grupo de Teatro FJA)
A: 17/5/2008 - 21.30h, Cine-Teatro São Luís
Sinopse
O homem mata a sua mulher.A mulher recusa-se a estar morta.A médica faz o parto à mulher morta.A amante pede ao homem para matar a mulher.A amante morre…Não não. A mulher morre. É assim? Já não sei…A Juíza que decida!O homem não está louco, Não está Louco, Louco!
Ficha Técnica:
Texto: Jorge Palinhos
Encenação, Espaço Cénico e Figurinos: Diana Sá
Elenco: Carla Leite, Catarina Ribeiro, Filipe Salgado e Natália Ribeiro
http://fundacaojorgeantunes.com
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O Último Baile... do Sr. José da Cunha
Comédia com encenação de Ricardo Silva
Org. Junta de Freguesia de Gulpilhares/ TEAGUS-Teatro Amador de Gulpilhares
Auditório de Gulpilhares, 2008-05-10
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DOIS PERDIDOS NUMA NOITE SUJA
TEATRO MUNDIAL (PICOAS)
De Plínio Marcos
Encenação de Sílvio Guindane
Com André Gonçalves e Freddy Ribeiro
De 24 de Abril a 18 de Maio
De quinta a sábado às 21h30 domingos às 17h30
Preço dos bilhetes: 20€
Informações: 21 412 17 97
Reservas: 21 357 40 89
Sinopse
Paco e Tonho são dois operários falidos e semi marginalizados de um Mercado de Peixe do cais do porto. Enquanto Paco é um ser tomado pelo sentimento de provocação e agressividade aparente, Tonho, mais velho, tem em seu peito uma grande vontade de crescer na vida, fazer valer o estudo que cursou, por isso desenvolve uma espécie de dependência aos valores socialmente válidos que se recria neste espetáculo relacionado a um par de sapatos.
Estes sapatos representam dentro da critica de Plínio Marcos todos os valores materiais do capitalismo, da exaltação da imagem e do desencaixe social que existe com o ser humano.A agressividade de um e a passividade de outro, dentro deste mundo tão peculiar desnuda o comportamento destes dois indivíduos dilacerando assim uma luta de cérebros até a destruição, luta esta que poderia acontecer com qualquer um de nós, mesmo não sendo nós semi marginalizados de um mercado de Peixe do cais do Porto.

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Masterclass por Juan Mayorga no
31º Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica – FITEI
inscrições abertas
O 31º FITEI vai organizar uma masterclass com Juan Mayorga, um dos nomes em destaque nesta edição do Festival. Dirigido a estudantes e profissionais de teatro, cinema e jornalismo, a masterclass pretende ser um espaço de pesquisa do autor espanhol com os participantes, a partir dos textos escritos por Mayorga.

A entrada é livre, sujeita à limitação de 25 inscrições. A masterclass realiza-se no dia 1 de Junho, Domingo, das 10h00 às 13h00, na Sala Polivalente do IPJ.
A ficha de inscrição deverá ser enviada por correio (Rua do Paraíso, 217, 2 - sala , 4000-377 Porto) ou e-mail para geral@fitei.com até ao dia 23 de Maio.

Em 2008, o Fitei inicia uma nova secção, com a finalidade de proporcionar aos estudantes um contacto directo ao nível de formação com criadores de reconhecido mérito do meio teatral. Para esta edição do Festival, são propostas três iniciativas:
Uma oficina de cenografia com Ulisses Cohn, um workshop com Ana Vallés ("EL VICIO DE MIRAR") e uma masterclass com Juan Mayorga.
Trata-se de uma oportunidade dos estudantes das escolas de teatro e não só de terem contacto com a experiência e formas de trabalhos dos autores convidados.
Juan Mayorga nasceu em 1965 em Madrid. Licenciado em filosofia e matemática, dedicou-se à filosofia da história e da estética. A sua tese de doutoramento intitula-se "A filosofia da História de Walter Benjamin" e aborda as obras de Walter Benjamin, Ernst Jünger, Georges Sorel, Donoso Cortés, Carl Schmitt e Franz Kafka. É membro do grupo de investigação " O Judaismo. Uma tradição esquecida na Europa" do Instituto de Filosofia do Conselho Superior de Investigação Científica. Publicou ensaios e diversos textos sobre Lope de Vega, Artaud, Dürrenmatt, Heiner Müller, Valère Novarina e José Sanchis Sinisterra, entre outros. É membro do conselho de redacção da revista "Primer Acto". Ensina dramaturgia e história das ideias na Real Escuela Superior de Arte Dramático de Madrid. Mayorga começa a dedicar-se à escrita teatral em 1989, ano em que é nomeado para o prémio Marqués de Bradomín por Siete hombre buenos. Estreou ou publicou os seguintes textos para teatro:- Siete hombres Buenos (1989)-. Más ceniza (1992), El traductor de Blumemberg (1994-2000), Concierto fatal de la viuda Kolakowski (1994), El hombre de oro (1996), El sueño de Ginebra (1996), El jardín quemado. (1998), La mala imagen (1997), Legión (1998), La piel (1998), Amarillo (1998-2000), El Crack (1998), Angelus Novus (1999), Cartas de amor a Stalin (1998), La mujer de mi vida (1999), BRGS (2000), El Gordo y el Flaco (2001), La mano izquierda (2001), Una carta de Sarajevo (2001), Encuentro en Salamanca (2002), La biblioteca del Diablo (2001), Camino del cielo (2002), El buen vecino (2002), Sonámbulo (A partir de "Sobre los ángeles", de Rafael Alberti) (2003), Animales nocturnos (2003), Tres anillos (2004). Foi ainda co-autor, com Juan Cavestany, de Alejandro y Ana e autor de Lo que España no pudo ver del banquete de la boda de la hija del presidente (2003), Ultimas Palabras de Copito de Nieve (2004) e Hamelin (2004) . Traduziu e adaptou A Visita da Velha Senhora de Friedrich Dürrenmatt (2000), O Monstro dos jardins de Calderón (2000), A dama boba de Lope (2002) Nathan, O Sábio, de Lessing (2003). A sua peça Cartas de Amor a Stalin, em tradução de José Martins, está editada na Campo das Letras. E O Tradutor de Blumemberg, em tradução de António Gonçalves foi editado na Revista "Artistas Unidos".
Masterclass com Juan Mayorga
Sala Polivalente do IPJ
Rua Rodrigues Lobo, Porto
1 de Junho 2008, Domingo, das 10h00 às 13h00
Mais informações em www.fitei.com > Notícias Fitei
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FITEI - Newsletter 12
É já no próximo dia 28 de Maio que arranca a
31ª edição do FITEI – Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica.
Durante doze dias, entre estreias e alguns regressos ao Festival, serão 24 espectáculos proporcionados por 15 companhias, de Portugal (7), Espanha (5), e Brasil (1), com destaque para 3 espectáculos de rua, a acontecerem junto à Casa da Música, na Avenida dos Aliados e na Fundação de Serralves.
Nas actividades paralelas, entre outras iniciativas, destaque para a apresentação do Plan Galego das Artes Escénicas, o documento estrutural da política cultural da Xunta da Galicia. Para este ano, o Festival abre uma nova secção – Oficinas FITEI, com uma masterclass com o autor espanhol Juan Mayorga, uma oficina de cenografia por Ulisses Cohn e o workshop dirigido pela coreógrafa e encenadora Ana Vallès.
Revistas de teatro espanholas no Fitei
O FITEI vai contar este ano com a cobertura jornalística das principais revistas espanholas especializadas em Teatro. A Artez, Primer Act e a Revista Galega de Teatro são algumas das confirmações para esta edição do Festival. O interesse da imprensa especializada espanhola no FITEI vem reforçar a importância e abrangência internacional do Festival
Blogue do festival
Informações e notícias sobre o mundo do teatro ibérico em
http://www.fitei.blogspot.com



quarta-feira, abril 23, 2008

O QUE É A CULTURA ?


O QUE É A CULTURA? (1)
Por Augusto Boal

Palavras são meios de transporte, como o trem, a bicicleta e o avião; a palavra Cultura é um enorme caminhão que suporta qualquer carga. É necessário defini-la, para que saibamos do que estamos falando, quando dela queremos falar.
Cultura é o que estamos fazemos aqui, agora, neste instante, discutindo o que é a Cultura.
Cultura é este microfone, esta mesa, esta sala. Nada disto existia - é fruto da mão humana, executora de nossos pensamentos e desejos.Este encontro não é apenas "um" exemplo do que seja a Cultura: é o máximo exemplo, pois Cultura é a reflexão do ser humano sobre si mesmo e sobre o mundo, e sobre o que faz neste mundo. É o feito e o fazer, é o como fazer o que se faz. É a criação de uma realidade não prevista nos desígnios da Natureza. Um Real objetivo, como a construção de casas e pontes, feitas de pedra; e um Real subjetivo, como a Moral, feita de valores. A Cultura possibilita e engendra a Arte, que é o seu estado supremo e soberano. Uma lenda antiga e distante - e tudo que é distante e antigo nos dá a impressão de verdadeiro - diz que a Arte tornou-se necessária para completar a incoerente e desorganizada criação divina. Deus, segundo a lenda, por mais perfeito, veloz e talentoso que tenha sido, tinha também seus limites, e não foi capaz de completar a Obra que havia planejado, no tempo que havia calculado. Calculou mal: seis dias mostrou-se curto prazo, mesmo para o Todo Poderoso, pois que o Poder, ao existir, fixa seus limites; se não os tivesse, seria também meu, nosso e vosso, seríamos todos divinos: o poder seria substância universal e não predicado do poderoso. Até o Poder tem fronteiras.Deus, cansado - toda força, na exaustão, encontra seus limite - desconsolado e triste, buscou merecido descanso no domingo, mas não sem antes apelar para os Artistas que logo vieram em seu socorro para reorganizar o mundo que ele mal havia - e havia mal - criado. Os sons divinos andavam por aí, espalhados, notas, claves e bemóis - sonoridades ao vento, enlouquecidas na imensidão vazia... Vieram compositores para lhes dar estrutura e razão: eis a sonata, o samba e a canção. A matéria prima era divina; mas a forma tinha os contornos de Villa Lobos, Cartola, Dolores Durán e Nelson Cavaquinho, para não citar nenhum presente.As cores, espalhadas e sem rumo, andavam às turras com o traço, buscando perspectivas na vida e no espaço - vieram os artistas plásticos e pintaram quadros, esculpiram estátuas, grafitaram paredes, e nos fizeram entender o que Deus quis fazer, mas não teve tempo; quis dizer, mas não disse.
As palavras, esses seres estranhos que não existem - são riscos na areia que as ondas do mar apagam; sons, que a leve brisa dissolve com suas carícias -, as palavras eram vazias e tortas, desengonçadas - até que chegaram os poetas para domesticá-las, dando-lhes sentido e destino.
Só os seres humanos são capazes de criar Arte e Cultura - que é a coerência com a qual o Artista vê o mundo, corrige e completa a obra de Deus que, assim, se revela e resplandece. Vivam os artistas! Mas coerência nem sempre é virtude, como nem sempre a Moral é Ética. A Cultura, que faz existir o imaginado, que é invenção do novo, do necessário e útil - e do belo, tão útil como necessário -, pode-se extasiar diante de si mesma e mergulhar nas águas de Narciso. O Artista, inebriado, pode pensar-se Deus e parir a arte pela arte. Pode, ao contrário, congelar seus caminhos, e se estiolar na repetição.
A Cultura, no fio da navalha, cria, destrói e recria. Quando, querendo instaurar o novo, fixamos nossos caminhos, a cultura se cristaliza na Técnica, que nos permite inventar e apressa o invento, mas que pode nos obrigar a segui-la, e servi-la - ajuda ou atrapalha. Quando fixamos nosso comportamento na sociedade, a Cultura se cristaliza na Moral, tão necessária, mas que pode ser odiosa. Tudo, neste mundo em trânsito, transita.
Cultura, traduzida em Arte, deve ser criação permanente, revolucionária, conquista do novo, nunca estratificação do conquistado. Pode-se transformar em Indústria, pode-se inserir na Economia, sim, mas desde que o criador seja o Artista, sempre o Artista, e não o produtor, que deve trabalhar com aquilo que foi criado, e não criar limites à criação. O artista cria o que não existia; o produtor, ao que existe, abre caminhos. Se o produtor serve ao Mercado, deve ter claro que Mercado quer a repetição estéril, do já feito e conhecido, sem sobressaltos; o Artista quer inovar. O Mercado, eclético, mercadeja arte e sabão em pó, porque ambos são necessários e vendáveis, mas não é justo confundir artista e saponáceo. É verdade que nós, artistas, queremos vender nossos discos, livros e quadros, queremos a casa cheia, mas não ao preço da renúncia daquilo que nos explica e justifica: a Arte, que será sempre revolucionária, ou nada será.Repito, sempre, que não temos nada contra o comércio, como tal. Admiro mesmo os comerciantes que fazem do seu comércio uma arte, mas tenho pena dos artistas que fazem, da sua Arte, um comércio.
Cultura, traduzida em Moral, fixa a Tradição. A Tradição, em si, não é boa nem má, pois é criada por sociedades que não são eternas. Devemos cultivar as tradições humanísticas, mas, com energia, rejeitar as cruéis e desumanas.
No mês passado, eu estive na Índia com todo o meu Centro carioca, presidindo a fundação da Federação Indiana de Teatro do Oprimido, na mesma semana em que foi promulgada uma lei autorizando o Estado a tentar dissuadir os pai de forçarem o casamento de seus filhos crianças. A Lei dizia que, se esses casamentos já tivessem sido realizados, seriam válidos por respeito às tradições familiares. Casar crianças e obrigá-las à convivência é crime, e nenhuma tradição pode justificar um crime!Na mesma semana, foi promulgada, na mesma Índia, outra lei, a que protege as mulheres contra a violência doméstica. Está em vigor. Lei radical, exemplar, que condena e pune, não apenas a violência física e sexual, mas até mesmo o palavrão atirado contra a esposa ou namorada, a tia, a sogra, a filha ou a vizinha. Peço aos legisladores, porventura presentes, que levem em conta a sugestão indiana: seja a mulher quem for, nem palavrão, nem com uma flor.Exemplos de tradições culturais odiosas não nos faltam e, entre tantas, podemos citar os flagelos que são as guerras coloniais e as imperialistas, disfarçadas ou não; a pena de morte e a escravidão; o Cassino da Bolsa de Valores que faz, do Mercado, um Deus, e o cinema de Hollywood, Deus do Mercado; os genocídios étnicos, passados e atuais; o mundo em chamas.
Contra essas tradições sempre se lutou. A Revolução Francesa, que representou um bem para a Humanidade, não respeitou as tradições da realeza; nós, se tivéssemos mantido nossas tradições monárquicas, hoje não seríamos República.
Cruéis tradições devem ser combatidas com vigor por serem contrárias à humanização do ser humano. Mas devemos recorrer às nossas boas e sadias tradições quando somos invadidos pela mídia globalizada, arte enlatada, notícias manipuladas, ódio racial, pensamento único. Isto é a Cultura: acabar com as tradições malsãs criando novos caminhos, inventar uma Ética. Se, no Brasil, já foi tradição a fome no Norte e Nordeste, Cultura é dar de comer ao faminto. Se é tradição o latifúndio improdutivo, Cultura é permitir que, quem sabe, pode e quer, que o faça produzir. Se foi tradição servil imitar a arte alheia, surgiram os Pontos de Cultura para liberar a nossa criatividade, engenho e arte. Os Pontos de Cultura vêm nos lembrar que não se pode privatizar a denominação de Artista, pois Artistas somos todos nós, seres humanos: somos os inventores do mundo. Todos nós somos capazes de produzir Arte - não uns melhor que outros, mas cada um melhor do que si mesmo. Esta é, em Arte, a única competição que devemos aceitar: eu, comigo. Como escreveu o poeta quinhentista português, Sá de Miranda: "Comigo me desavim, sou posto em todo perigo, não posso viver comigo, nem posso fugir de mim".
Isto é Arte: todos nós conosco nos desavimos e, como somos artistas, nos desaviremos sempre, conosco e com o mundo, até mudarmos o mundo que temos, e mudar o que faremos.Se era tradição nortear nossos passos pelo que fazem os países do Norte, temos agora que usar o neologismo de um amigo meu, temos que "sulear" nossos caminhos, estendendo a mão amiga aos países que estão nesta mesa, e a outros que, nesta mesa, também têm assento e, no nosso coração, lugar. Reconhecemos a nossa fraternidade com os países da América Latina, como o Equador; africanos, como a África do Sul; asiáticos, como a imensa Índia; e eu, como bom português trasmontano que também sou, de Justes e Vila Real, saúdo a presença querida de Portugal. Muito obrigado.

NOTA
1. Intervención en la mesa redonda "¿Qué es la cultura?", Río de Janeiro, Fórum Cultural Mundial, 24 de noviembre de 2006.

(Retirado dos Cadernos do CELCIT, n.º 31)

terça-feira, abril 22, 2008

ÚLTIMAS NOTICIAS


Um livro obrigatório para os amantes do Teatro


UMA SETA TRANSPORTADA NA MÃO DA TESTEMUNHA

O Espaço Vazio, de Peter Brook



texto Pedro Manuel (extraído da revista OBSCENA

Voltar ao espaço vazio será regressar à linha de partida. E voltar, aqui, não será tanto regressar atrás no tempo, mas reencontrar o lugar do teatro. E, para Peter Brook será sempre um lugar partilhado, entre quem vê e quem dá a ver.
À primeira vista, a edição portuguesa de O espaço vazio traz o sabor de um reencontro e apresenta-se já recoberta com o estatuto dos clássicos: é publicada quarenta anos após a edição original e inscreve-se no contexto social e teatral dos anos 60. Nesse sentido, peca por tardia e, naturalmente, nestes quarenta anos já foi lida por quantos a quiseram encontrar. No entanto, faz sentido trazer esta obra ao dia, na medida em que é determinante a acessibilidade em português a obras-base sobre artes performativas, assim como Peter Brook é um encenador activo e presente, continuando a moldar o território teatral com a sua experiência e experimentação.
Mas, sobretudo, em O espaço vazio, é o discurso de uma testemunha que importa descobrir. Não só pelo olhar datável, mas pela visão pessoal, atenta, reflectida, culta.
O início do texto é exemplo da forma como orienta as observações com o seu pensamento: “Posso chegar a um espaço vazio qualquer e usá-lo como espaço de cena. Uma pessoa atravessa esse espaço vazio enquanto outra pessoa observa – e nada mais é necessário para que ocorra uma acção teatral.” A partir daqui o texto estrutura-se em quatro blocos temáticos (o Teatro do Aborrecimento Mortal, o Teatro Sagrado, o Teatro Bruto e o Teatro Imediato) e, em cada um, Brook descreve e disserta sobre o teatro: da Royal Shakespeare Company ao Living Theatre, dos happenings a Grotowski, passando por diversos autores, para além das histórias de vudu haitiano ou o excelente exemplo dos escravos do México - ou não tenha Peter Brook contribuído para uma certa “globalização” das artes perfomativas, presente ainda nos seus espectáculos.
A análise de cada caso tem por prumo a eficácia da comunicação teatral. O excerto citado vale como uma axioma nesse sentido e diz bem João Mota (numa entrevista sem perguntas, apresentada como posfácio, mas com valiosas passagens sobre a sua experiência como actor com Peter Brook): “O espaço vazio é mais do que um espaço cénico: é um espaço interior”. Não um regresso ao passado, um momento anterior, mas um lugar interior. Trata-se de pensar a comunicação teatral e, em última análise, a comunicação humana que, no espaço-tempo teatral, se torna um instante de partilha.
Será ainda interessante inscrever O Espaço Vazio junto de outros clássicos teatrais pelo seu carácter vivencial, empírico (Stanislavski, Meyerhold, Brecht, Grotowski). Fala a “voz da experiência”, de quem esteve lá, a voz da testemunha. Como as palavras de João Mota. A literatura sobre teatro está cheia de perspectivas biográficas, de “Memórias” de inúmeros actores, e isso deverse- á, talvez, à humanidade desse acto comunitário. É por isso que o teatro pode acontecer em qualquer parte e, quando acontece, “cria memória”, como diria o encenador João Brites.
A passagem do “Teatro do Aborrecimento Mortal” para os outros tipos de teatro é a passagem de um espaço cheio (de artifícios) para espaços vazios, isto é, interiores. Ainda assim, a testemunha Peter Brook coloca-se de forma ambígua, entre o encenador e o espectador e, em cada caso, observa a comunicação desse interior, o preenchimento desse espaço. Mas é a qualidade do seu testemunho que tornam O espaço vazio um clássico: ao mesmo tempo que data uma época fervilhante, recolhe ao interior, para pensar a memória e narrá-la do seu ponto de vista, montando o seu teatro. Um livro obrigatório na estante dos estudos de teatro mas, sobretudo, um convidado muito especial para receber na sala de estar.

(€15, Orfeu Negro tradução de Rui Lopes)

A PRIMEIRA VEZ


por Paulo Sacaldassy

Como explicar esse momento mágico? A primeira vez sobre um palco é sempre inesquecível. Mas, tudo o que envolve esse momento, transcende a qualquer lucidez da razão. Na noite anterior da apresentação, a barriga dói, a ansiedade toma o lugar do sono, o medo de esquecer o texto já apavora, e um rolar na cama é o movimento mais constante.
Eis então que chega o grande dia, as olheiras denunciam a noite mal dormida e a ansiedade se faz companheira, mesmo com todos os exercícios na tentativa de reverter, ela parece incontrolável. E quanto mais se aproxima a tão desejada hora, mais o nervoso se faz presente.
Ufa! Já no camarim, maquiagem pronta, figurino vestido, o texto passado e repassado várias vezes, a respiração um pouco mais controlada, demonstra uma certa dose de auto-controle. Mas, o burburinho vindo da platéia aumenta a adrenalina, as mãos suam, a barriga volta a doer, o suor corre insistentemente sobre a maquiagem retocada por várias vezes.
Primeiro sinal. Ai, meu Deus! Agora não tem como voltar atrás! Segundo sinal. Nervossismo, suador, dor de barriga, concentração, tensão. Terceiro sinal. Merda!… Merda!… Merda!
Agora sim, em cima do palco, cortinas abertas, o texto na ponta da língua, o nervossismo ficou nas coxias, a dor de barriga ficou para trás, não tem mais ansiedade, o suor agora verte da interpretação, a tensão agora faz parte do drama e a emoção de estar sobre o palco, dá o seu lugar às emoções da personagem.
Parecia que não chegaria, mas passou tão rápido que dá vontade de fazer e passar por tudo de novo. E acho que é por isso que quem sobe ao palco pela primeira vez, e sente esse turbilhão de sensações que nos revira por dentro, sempre quer mais e mais.
O teatro é assim, sempre vai ser como a primeira vez, e não interessa quão experiente a pessoa seja, ela sentirá sim, tudo, tudo do mesmo jeitinho, como se fosse a sua primeira vez. Por tudo isso, se hoje for a sua primeira vez, muita Merda para você!


Paulo Sacaldassy, dramaturgo, roteirista, poeta e letrista. Mantém um blog chamado "poucas palavras" onde publica poesias e artigos. Colabora como Colunista do site Oficina de Teatro.