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sexta-feira, janeiro 18, 2008

DO ANIMISMO À MAGIA ( ii )

AOS LEITORES DESTE BLOG
Dada a receptividade ao texto sobre a História do Teatro anteriormente publicado, informamos que iremos continuar a publicar esta temática, de forma mais sistemática.
A todos quantos nos incentivaram, um enorme abraço de reconhecimento.

Do animismo à magia
Ainda hoje, nas comunidades aborígenes, o Homem sente-se simultaneamente uma parte integrante da natureza, mas também sua vítima, quando ela, nem sempre pródiga, lhe lança os mais terríveis desafios.
Para o homem primitivo, as forças ocultas que pareciam manipular a natureza constituíam enigmas e ameaças que importava decifrar e atenuar. Daí a crença nos deuses ignotos que tudo controlavam e tornavam o homem indefeso perante os seus imensos e desconhecidos poderes, perante as suas «fúrias». A tribo buscava então aplacar essas «iras» através de rituais e sacrifícios que pudessem «acalmar a fúria dos deuses». Noutros casos, implorava mesmo os seus favores para caçadas ou batalhas.
Dos múltiplos mistérios da existência, a Morte era o maior de todos os inimigos (e enigmas) do Homem, parecendo espreitá-lo em cada sombra da floresta, em cada precipício, em cada predador. Mas eis que ele descobre o Fogo e com isso dá um passo gigantesco no seu desenvolvimento. Modifica substancialmente a sua dieta alimentar, com isso provocando significativos avanços no seu desenvolvimento. O poder do fogo permite-lhe ainda afastar os animais selvagens, defender-se das suas ameaças e até atacá-los, vencer o frio, partilhar em colectivo o ambiente agora mais acolhedor da caverna. Esta era, sem dúvida, a mais importante dádiva dos deuses a que ele tinha de responder com a gratidão de quem está consciente do bem que adquirira.
A religião terá nascido como consequência de tudo isto, do medo e da necessidade de o vencer, da consciência da existência de forças tão poderosas como desconhecidas e da imprescindibilidade de as aplacar, do apelo ao favor dessas forças, do apelo ao sucesso nas caçadas, do apelo à sobrevivência na luta constante para prolongar a Vida retardando a Morte.
Ele já está consciente de que isolado é frágil e vulnerável, mas em grupo pode ultrapassar muitas das suas fraquezas e dificuldades. E se isto é verdade na luta pela sobrevivência, torna-se igualmente verdade no culto às divindades. É importante que o grupo se proteja e por isso encontra formas de, colectivamente, gerir a sua comunicação com os deuses: nasce o ritual mágico, no qual ele mima o homem, os animais, os elementos, recorrendo ao gesto, à voz, ao corpo, à dança, pintando-se ou mesmo mascarando-se. Mima cenas do seu quotidiano, grita, gesticula, dança, canta, em suma: comunica com os deuses. Este ritual, que não é ainda teatro, irá mais tarde assumir contornos que o levarão posteriormente ao «espectáculo», em rituais que já possuem «coreografias», que já integram «personagens» representando diferentes papéis na comunicação religiosa.
Será, pois, com os primeiros actos de religiosidade que nascerá o espectáculo teatral. O teatro aparece pela via da representação gestual e oral de passagens dos livros sagrados. No Egipto como em Creta, na Mesopotâmia como na Palestina, na Índia como na Grécia, as primeiras manifestações teatrais terão nos mitos e nos deuses a sua primacial motivação. Mesmo na Idade Média, o teatro só logrará trilhar os caminhos do profano depois de se autonomizar das representações litúrgicas de cenas bíblicas.


Milhares e milhares de anos decorreram entre as primeiras comunidades e aqueloutras que se iniciaram na pintura das cavernas e das rochas. Muitos milhares de anos se passariam ainda até surgirem as primeiras manifestações teatrais organizadas. Em qualquer dos casos, no entanto, era a existência nas suas múltiplas facetas que, através do homem, se representava a si mesma.
«Não é também teatral a sociedade, e a existência não se revela desdobrando-se para se representar a si própria», como perguntou Jean Duvignaud?
FERNANDO PEIXOTO

4 comentários:

Isamar disse...

Um post interessantíssimo para o estudo da História do Teatro no 9º ano de escolaridade. Além do estudo da obra de Gil Vicente, o pai do teatro português,faz parte do programa a sua contextualização no panorama do teatro através dos tempos.Este blogue constitui um recurso muito interessante para o estudo desse tema.
Muito obrigada pelo teu contributo, Fernando.
Continua a contar-nos a história do Teatro no mundo que começou, como relatas, muito antes da tragédia e da comédia gregas.
Beijinhos

São disse...

Muito te felicito por mais um interessante texto de divulgação.

Um grande abraço.

Unknown disse...

Olá Fernando, cá estou eu na 1ª fila, "aguardando" o próximo ato.
Abraços
Beth - Brasil

Branca disse...

Muito interessante desenvolvimento da História do Teatro.Fascinou-me todo o texto e sobretudo a conclusão final, através da frase de Jean Duvignaud.
E cá vou eu para o texto seguinte que a leitura está a entusiasmar-me.
Até já.
Beijinho